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2 de out. de 2009

Segurança Pública: uma visão crítica

Subsídio para a Campanha da Fraternidade de 2009
Frei Gilvander Moreira


A Campanha da Fraternidade de 2009, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB - acolhe um grande clamor social: Segurança Pública. O Lema “A paz é fruto da justiça!” aponta o rumo que deve ser seguido pela sociedade para, de fato, se conquistar segurança pública.

1. Realidade e clamor dos presos
Segurança pública é mais do que prisões, mas prisões são o termômetro da insegurança institucionalizada que reina no Brasil. A violência é um dos maiores problemas enfrentados pelo povo brasileiro. A polícia do Brasil é uma das mais violentas do mundo. Os índices de homicídios são comparáveis aos de países em guerra.
Vinte anos atrás, havia no Brasil 20 mil presos. Nos últimos anos o número de presidiários cresceu assustadoramente. Segundo o Conselho Nacional de Justiça – CNJ - até dezembro de 2008 havia no País 446.687 presos. Deste total, 42,97% eram presos provisórios (não foram ainda julgados e condenados) e 57,03% condenados, a maioria por crimes contra o patrimônio (roubo e furto). Há mandado de prisão para cerca de outros 500 mil.
O presidente do Supremo Tribunal Federal – STF - ministro Gilmar Mendes, disse no dia 16 de fevereiro de 2009: “Aproximadamente um terço da população carcerária nacional se encontra recolhida aos presídios indevidamente. Ou porque já cumpriu a pena ou porque não deveria ter sido recolhida”.
Grande parte dos investimentos “sociais” dos governos tem sido aplicada no sistema de segurança e no prisional: no aumento vertiginoso de efetivo policial, no número de viaturas e de prisões. Prisões superlotadas, onde a integridade física e mental dos presos não está sendo respeitada.
As prisões brasileiras, hoje, são verdadeiros “campos de concentração”. A quase totalidade dos presos é pobre, negra e jovem.
Em uma cadeia de Ponte Nova, Minas Gerais, no dia 23 de agosto de 2007, 25 presos morreram queimados durante um incêndio. Outros oito presos foram queimados vivos em Rio Piracicaba, MG, em janeiro de 2008, e outros três, numa cadeia de Arcos, MG. Em menos de um ano, só em Minas Gerais, 36 presos morreram queimados em prisões; feridos, centenas.
Em Belo Horizonte, uma grande escola foi transformada na Penitenciária Feminina Estevão Pinto, hoje, com mais de 300 mulheres presas. Três anos atrás havia 130 presas.
O Governador Aécio Neves está construindo muitas penitenciárias. Uma delas será em Ribeirão das Neves – em regime de Parceria Público- Privada (PPP) - com capacidade para abrigar cerca de três mil presos, sendo que as empresas donas da prisão receberão 75 reais por preso por dia. (75,00/preso X 3.000 presos X 30 dias = R$6.750.000,00 por mês). O povo da região não aceita mais prisões, pois Ribeirão das Neves é conhecida como “a cidade das prisões”, isso por causa do grande número de penitenciárias já existentes na região.
Em 10 de novembro de 2005, proferindo sentença em uma ação civil pública movida pelo Ministério Público contra a situação carcerária do 1o Distrito Policial de Contagem, em Minas Gerais, o juiz Livingsthon José Machado determinou a soltura de 16 presos - todos eles pobres, negros e jovens -, sob o argumento de que a incúria do Estado feria o artigo 5o, LXV da Constituição Federal.
Esse inciso diz o seguinte: “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”. Provada a ilegalidade – 63 presos em uma cela com capacidade para apenas sete; provada a insalubridade; provado o risco à saúde dos presos - pessoas enfermas amontoadas junto com pessoas sadias; provado o abuso de manter presos sentenciados em até quatro anos em cela insuportável, sem encaminhá-los para uma penitenciária; dada a incapacidade de o juiz mandar construir cadeias (já tinha exigido do governo, mas não foi atendido.), o juiz dr. Livingsthon José Machado concluiu, após interpretar com inteligência a Lei em vista dos princípios constitucionais: uma prisão que não cumpre os requisitos da lei é uma prisão ilegal e deve ser imediatamente relaxada.
O Governador Aécio Neves e a mídia investiram contra o juiz Livingsthon alegando que ele teria colocado “marginal na rua”. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, insensível aos clamores dos presos, afastou o juiz de suas funções.
O dr. Livingsthon fundamentou a soltura dos presos no respeito que a Declaração universal dos Direitos Humanos consagrou à humanidade, que assim dispõe: "Ninguém será submetido a tratamento cruel, desumano ou degradante...".
Por essa razão, a soltura dos presos ganhou uma dimensão oportuna, no que tange à interpretação dos direitos humanos em tempos de desumanidade sangrenta nas cadeias de Minas e do Brasil. A situação carcerária em que vivem os presos é degradante e cruel, e isso não é fato novo.
Portanto, a libertação de alguns presos traz à tona as mazelas do sistema penal e da farsa da Segurança Pública no Brasil. Com a sua atitude, o juiz Livingsthon humaniza o direito e faz cumprir o que a sociedade desejou na elaboração da Lei de Execuções Penais.
Em vez de investimento em políticas sociais públicas - moradia popular, reforma agrária, saúde, educação, preservação ambiental, economia popular solidária, transporte público ... -, os governos, assim como parte da sociedade, estão investindo em segurança.
Lembrete: a estatística sobre o sistema penitenciário brasileiro leva em conta pessoas presas em regimes fechado, semi-aberto, provisório e sob medida de segurança.
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Frei Gilvander Luís Moreira

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