Auxílio-Reclusão: mentiras, verdades e análises possíveis
Bárbara Ferreira de Freitas - Nelson Gomes Junior
Circula na internet, já há algum tempo, um email tipo corrente promovendo uma falsa campanha de esclarecimento acerca de um benefício previdenciário voltado para dependentes de segurados do INSS. A polêmica gira em torno do chamado “auxílio-reclusão”, benefício perversamente apelidado de “bolsa bandido” pelos autores do spam que vem se multiplicando, reforçando preconceitos e deturpando informações.
A Constituição Federal de 1988 foi a primeira a utilizar o conceito de seguridade social, o qual abrange saúde, assistência e previdência social, sendo esta última de caráter contributivo, ou seja, só é possível obtê-la por meio de pagamentos na forma da lei. A finalidade da previdência é cobrir os riscos sociais comprometidos pela falta de renda do contribuinte ou de sua família, tais como nos casos de doença, acidente, gravidez, prisão, morte e velhice. Conforme previsto nas leis 8.212/91 e 8.213/91, de um total de 10 benefícios previdenciários, 2 são pagos somente ao(s) dependente(s) do segurado: pensão por morte e auxílio reclusão, sendo este, fonte de muitos equívocos quanto à sua natureza, objetivos, beneficiários e valores pagos.
O auxílio-reclusão consiste em um benefício de prestação continuada da previdência social, de caráter alimentar, que tem por objetivo possibilitar que os dependentes do presidiário tenham como se manter enquanto ele, antes provedor e segurado, encontrar-se recluso. Tem direito ao benefício todo segurado de baixa renda recolhido à prisão, durante o período em que estiver preso sob regime fechado ou semi-aberto.
Faz jus ao benefício apenas a família do presidiário que tiver qualidade de segurado no momento da reclusão, sendo potenciais titulares do auxílio sua esposa(o)/companheira(o), filhos(as), irmãos(ãs) e/ou pais. Caso o segurado possua dois ou mais dependentes, o auxílio será dividido igualmente entre os seus beneficiários. Em caso de morte do preso durante o período de pagamento do auxílio-reclusão, o benefício se converte em pensão por morte.
Em oposição ao boato eletrônico que insinua que o benefício em tela trata-se de um estímulo ao ato criminoso, o auxílio-reclusão visa cumprir o ditame de justiça social, protegendo a família do segurado da inesperada situação de vulnerabilidade social e econômica oriunda da reclusão do seu provedor. Evita, por conseqüência, que seus dependentes tornem-se alijados de subsistência e sofram a punição cabível exclusivamente ao praticante do delito. Em última análise, o auxílio tende a garantir a proteção constitucional à família, sem perder de vista a defesa da dignidade humana, princípios frequentemente violados no cotidiano dos familiares de presos.
Os discursos caluniosos sobre o auxílio-reclusão cumprem o papel reacionário de manutenção de preconceitos, estereótipos e negação de direitos aos segmentos mais vulneráveis da população. Os pobres, reiteradamente criminalizados pelos mecanismos seletivos de nosso sistema penal, configuram-se novamente como alvo preferido de dispositivos de controle, camuflados agora pela retórica da moralidade e do bom uso do dinheiro público.
É pouco razoável associarmos o auxílio-reclusão ao quadro de motivadores da criminalidade. Grande parte da massa carcerária deste país jamais conheceu a condição de segurado do INSS. Seria ingenuidade de nossa parte acreditar que alguém, estando empregado, escolheria altruisticamente cometer um crime e ser preso para “beneficiar” sua família. De igual maneira, não nos parece justa a perpetuação das “punições” estabelecidas aos familiares de preso, em especial porque não cometeram crime algum.
Publicado Originalmente no Jornal Contraponto em 21/10/2011.
Fonte: Concretudes Imprecisas
Atualmente, só tem direito ao auxílio o segurado que, à época da prisão percebia renda mensal igual ou inferior a R$ 862,60 e, desde que, quando da solicitação do benefício, não esteja recebendo salário da empresa na qual trabalhava, nem em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria. Diferentemente do valor alardeado no falso email, o auxílio varia de R$ 545,00 a R$ 862,60 por família, seja qual for o número de dependentes do segurado.
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