Este artigo foi publicado hoje na Folha de São Paulo. O advogado de Carlos Cachoeira, Márcio Thomaz Bastos, só falta chorar ao expor as razões éticas e profissionais alegadas para defender o seu cliente. O velho clichê da presunção de inocência e também a surrada defesa da Constituição, argumentos esses que - lembrando - só valem para ricos e bem nascidos... e brancos, fique bem claro.
Quero dizer, Dr. Márcio, que eu acreditaria em seu depoimento, e chegaria até a me emocionar de verdade, se a sua "verdade" valesse para todos, se o senhor usasse toda a sua energia e seu entusiasmo, ao exercer a defesa de Cachoeira, com os milhares de brasileiros jogados em nossas masmorras, presos sem defesa e por delitos que jamais deveriam levar um ser humano à infâmia do aprisionamento.
Há poucos dias, uma adolescente foi presa aqui em Minas Gerais por causa de uma briga na escola. Presa mesmo, num presídio cheio de homens, tal qual o presídio do Cachoeira. Ano passado, dois meninos foram "condenados" à pena de varrer e limpar a escola, porque no fim de semana eles pularam o muro para pegar umas bolas de futebol. E sabe que não apareceu um advogado para fazer valer a Constituição que proíbe humilhar e maltratar criança e adolescente???
Tragicamente, Dr. Márcio, no Brasil, seus dourados argumentos só valem mesmo para clientes ricos e poderosos.
Segue o artigo:
Segue o artigo:
Serei eu o juiz do meu cliente?
Márcio Thomaz Bastos
Joga-se Cachoeira à fogueira do ódio. Há apedrejamento moral, não presunção de inocência. O acusado é sempre oprimido pelos indignados de ocasião
A pergunta acima é mais que retórica. Trata de direito tão vital para a democracia quanto o de exprimir livremente opiniões. No império da lei -e não dos caprichos e preconceitos -, sua resposta é negativa.
A finalidade do processo judicial é a realização da justiça, por meio de regras equilibradas e imparciais de julgamento. O advogado contribui de forma especial, ao cumprir o dever de dar voz aos direitos do réu, na contraposição entre acusação e defesa. Ao exercer a liberdade de falar em nome de outra pessoa, sustentando suas razões jurídicas, assume grave responsabilidade social.
Se as paixões se exaltam, mais integridade se exige do profissional. Ele se expõe pessoalmente aos riscos e perigos de postular contra os arbítrios infligidos ao cidadão.
Em março, fui contratado para defender Carlos Augusto Ramos, chamado de Cachoeira, junto com uma equipe de técnicos e advogados.
Não o conhecia, embora tivesse ouvido falar nele. O caso requeria um trabalho longo e complexo. As investigações se desdobravam em diversas instâncias políticas e judiciais. Os autos contavam com milhares de folhas. O número de interceptações não era menos impressionante. A dificuldade de acesso foi imensa.
De início, Carlos teve prisão decretada e foi levado ao presídio de Mossoró, em regime de isolamento. Não havia motivos para isso. Convencemos o TRF a transferi-lo para Brasília, mais perto da família. Foi o primeiro êxito da defesa técnica.
Em seguida, a CPMI o convocou a depor no Congresso. A sessão foi suspensa pelo STF, para que os defensores pudessem conhecer o teor das apurações. A decisão efetivou o direito fundamental de permanecer calado. A defesa pediu o que a Constituição já garantia.
Enquanto isso, a Vara Federal designava audiência da ação penal que corria por lá. Em apenas dois dias, seriam concentrados diversos atos processuais. Como não apresentar defesa escrita para refutar denúncia de 205 páginas, num processo com mais de 100 volumes? Ainda assim, os debates seriam apenas orais! Desequilíbrio evidente.
O pior é que os advogados não haviam tido a oportunidade de se avistar em particular com seu cliente. O significado dessa garantia básica é intuitivo, num ambiente que sabe moderar, pelo direito, a ânsia de punir. Sem isso, a repressão degenera em implacável perseguição.
A defesa de Carlos Augusto teve de bater novamente às portas da Justiça. Conseguiu suspender a audiência até que a normalidade fosse restaurada. Os defensores vocalizaram a palavra da lei, exprimindo posições que consideravam éticas.
Nesse curto tempo, porém, aconteceu o mais amplo e sistemático vazamento de escutas confidenciais. A pródiga história brasileira dos abusos de poder jamais conheceu publicidade tão opressiva.
Estranhamente, a violação de sigilo não causou indignação. As ambiguidades de nosso liberalismo explicam a condescendência.
Dia após dia, apareceram diálogos descontextualizados, compondo um quadro que lançou Carlos Augusto na fogueira do ódio generalizado. Trocou-se o valor constitucional da presunção de inocência pela intolerância do apedrejamento moral.
Serei eu então juiz do meu cliente? Por princípio, creio que não. Sou advogado constituído num processo criminal. Como tantos, procuro defender com lealdade e vigor quem confiou a mim tal responsabilidade
Com Carlos, não poderia ser diferente. Falando pela legalidade no seu processo, os defensores honram seu mandato. Não transgridem, antes realizam o primado da lei. Não há exagero na velha máxima: o acusado é sempre um oprimido.
"O abuso de poder é o pior dos delitos, pois atinge a todos indistintamente", teria dito um inadvertido defensor da liberdade. Pagou com a vida, no ápice do terror revolucionário. "O clamor popular é o tribunal supremo da salvação nacional", guilhotinavam os indignados de ocasião.
Ao zelar pela independência da defesa técnica, cumprimos não só um dever de consciência, mas princípios que garantem a dignidade do ser humano no processo.
Assim nos mantemos fieis aos valores que, ao longo da vida, professamos defender. Cremos ser a melhor maneira de servir ao povo brasileiro e à Constituição livre e democrática de nosso país.
15 milhõe$$$ de razões para ele defender essa "cachoeira" de $$$, rsrs!
ResponderExcluirhttp://educaforum.blogspot.com.br/2012/05/o-ex-ministro-marcio-thomaz-bastos-e.html
Por "defesa técnica" o digníssimo Dr. Márcio Thomaz Bastos quer dizer "encontrar uma brecha técnica na lei para que provas sejam excluídas e um culpado seja absolvido". Infelizmente o nosso ex-ministro, que era tinha uma grande reputação no país, jogou-a, junto com sua honra, na lama, ou melhor numa Cachoeira de lama.
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