O ReComeço: Edição 162 do Recomeço impresso (no site)

1 de abr. de 2010

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Luiz Carlos Valois - Juiz de Direito do estado do Amazonas

"O sistema penal está repleto de doutores. Muitos deles nunca entraram numa penitenciária e passam longe da periferia com medo de serem assaltados, mas são eles que decidem sobre a conduta social e sobre a personalidade dos habitantes desses locais, para onde se conserva apontada a mira do poder repressivo."
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"A pessoa que já foi presa sempre vai estar estigmatizada. Nunca mais vai poder ser ela mesma, nunca mais vai ser livre. Com muita dificuldade ela pode conseguir trabalho, ruim e ganhando pouquíssimo, mas vai estar estigmatizada para sempre. A prisão além de não ressocializar ela estigmatiza. A prisão deixa uma marca para sempre." ( Fonte: aqui )

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Presos provisórios

"Entre os anos de 2003 até 2007, de acordo com os dados do Depen (2008), o “percentual de presos provisórios” subiu 88,8%, de 67.549 para 127.562 apenados. Segundo Carvalho Filho (2002) o destino de grande parte das pessoas que aguardam o julgamento em prisão tem sido o esquecimento, que pode durar anos, sendo que em muitos casos os acusados permanecem nessa situação por um tempo superior ao da pena prevista pelo crime de que é suspeito de autoria."

"Robson Sávio Reis Souza-Professor (PUC Minas).
Caderno e-metrópolis
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A sentença: condenação absurda

Leia na íntegra a sentença que condenou a editora do jornal Recomeço à prisão, em 2008, pelo "crime" de alertar as autoridades responsáveis do estado de calamidade em que se encontrava, na época, a cadeia de Leopoldina (hoje, presídio).
O juiz José Alfredo Junguer de Souza Vieira acusou de difamação, o Ministério Público ofereceu denúncia e a juíza Tânia Maria Elias Chaim condenou à prisão a autora do editorial em questão.
Histórico da notícia
Em 2011, caiu a sentença junto com os artigos da Lei de Imprensa, pela qual fui condenada.
A editora do jornal Recomeço agradece o apoio recebido pela Artigo 19 , Pastoral Carcerária Nacional e OEA, organizações de fundamental importância na luta pela justiça e liberdade de expressão.
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ANIVERSÁRIO DA VERGONHA*

http://www.jornalrecomeco.com.br/sentenca/

Triste data essa... nossa pequena cidade ficou mundialmente conhecida por uma equivocada (eufemismo) decisão judicial. Não esqueço das manifestações de repúdio à sentença, advindas da Revista Época, do Jornal Nacional, da OEA, etc. Marca-me:¨uma professora aposentada que num país de primeiro mundo deveria receber uma medalha de honra por defender os direitos humanos, no Brasil, recebe uma condenação...".

Parabéns, não pelo aniversário da desastrosa sentença, mas por ser uma data que emblema uma luta, desafios, quebra de paradigmas.

Que essa fonte de fraternidade fluente nunca seque.
*Mensagem de um leitor do Recomeço
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João Baptista Herkenhoff

Essa instituição que se chama prisão é a maior ameaça que existe à segurança pública. As prisões são escola do crime. Prisões lotadas deveriam tirar o sono da população, se a população estivesse bem informada do perigo público que é a prática de prender, às vezes na mesma cela, autores de graves e de pequenos delitos.
No concurso para ingresso na Magistratura e no Ministério Público, penso que seria proveitoso que, além das provas intelectuais, houvesse a exigência de um estágio obrigatório num estabelecimento penal.
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Massimo Pavarini*

"Entre os nórdicos, quando um juiz condena um preso, ele precisa saber a quantidade de vagas na prisão. Se não há vaga, outro preso precisa sair. O juiz indica quem sai. Porque é preciso responsabilizar o Poder Judiciário e a polícia pelos presídios. O cárcere tem de ser destinado aos mais perigosos."
"Quanto mais se castiga um criminoso leve, mais profissional ele será quando voltar ao crime".
*Professor da Universidade de Bolonha e considerado um dos maiores penalistas da Europa. (Entrevista na FSP, 04/09/2009, publicada na Pastoral Carcerária)
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VIOLÊNCIA POLICIAL

"A violência policial hoje em dia, de tão comezinha e rotineira, já não comove nem surpreende, apesar da grande repulsa que provoca nos cidadãos mais atentos.
Não há um dia sequer que não se ouça ou não se tenha notícia de um crime praticado pela Polícia. Neste exato momento, em alguma delegacia, em alguma rua deserta, em algum lugar ermo, é muito, mas muito provável mesmo, que algum policial esteja prendendo ilegalmente, extorquindo, espancando, torturando alguém."
* Trecho da sentença da juíza MARIA DE FÁTIMA FERREIRA DE BARROS
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Leonardo Isaac Yarochewsky*

A cadeia é a escola do crime, uma fábrica de delinquentes. Temos que reduzir ao máximo essa questão de prisão.
A partir do momento que começarem a responsabilizar a pessoa do promotor, do juiz, do desembargador que comete abusos, arbitrariedades, que deixa de julgar, e eles forem responsabilizados civilmente e criminalmente, não o Estado como instituição, aí pode ser que a coisa mude.
* Advogado e professor de direito penal da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica)
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GAZA É AQUI - 119 mortos

Rio-Morro dos Macacos-17/10/09
10 mortos leia
Rio-Morro do Juramento-16/9/09
4 mortos leia
Rio-Morro Serrinha/Madureira-2/9/09
3 mortos leia
Rio-Favela Vila Ideal-23/8/09
3 mortos
Rio-Pedra de Guaratiba-22/9/09
4 mortos
Rio- Morro dos Prazeres-21/8/09
2 mortos
Rio-Favela Nova Jersei-11/8/09
4 mortos leia
Rio-Vila Isabel-1º/8/09
1 morto leia
Rio-Favela Jacarezinho-23/7/09
1 morto
Rio-Morro da Mangueira-15/7/09
4 mortos leia
Rio-Morro Sto. Amaro-13/7/09
3 mortos - leia
Rio-Morro dos Macacos-11/7/09
3 mortos
Rio-Penha-3/7/09
5 mortos - leia
Rio-Morro do Chapadão.15/6/09
2 mortos
Rio-Vila dos Pinheiros.12/6/09
5 mortos
Rio-Favela da Maré.31/5/09
4 mortos - leia
Rio-Copacabana.22/5/09
3 mortos - leia
Rio-Favela do Mandela.12/5/09
4 mortos - leia
Rio-Favela do Jacarezinho.20/4/09
3 mortos - leia
Rio-Favela da Rocinha.25/3/09
3 mortos - leia
Rio-Ladeira dos Tabajaras.22/3/09
5 mortos leia
Rio-Favela Nova Holanda.5/3/09
3 mortos leia
Rio - Favela da Coreia.4/2/09
10 mortos leia
Morro da Mangueira.29/1/09
3 mortos leia
RJ- Macaé.22/1/09
4 mortos leia
Rio - favela da Coreia - leia
10 mortos - abril/2008
13 mortos - outubro/2007

NOTA - Os mortos são "suspeitos" executados pela polícia. Lembrar que esses números referem-se apenas à cidade do Rio de Janeiro.

Manifesto em repúdio à condenação de defensora de DH

Jurista Evandro Lins e Silva

“A prisão é realmente monstruosa, e eu tenho verdadeira alergia à cadeia. A política criminal de hoje dominante no pensamento científico dos estudiosos do direito penal é: prisão só em último caso. Só deve haver segregação de quem é perigoso. O cidadão não sendo perigoso, vamos encontrar uma maneira de permitir que ele volte à sociedade. (...) Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um pouco ao próprio delinqüente”
- Citação no artigo "A ajuda da universidade na reinvenção do sistema penitenciário", de André Macedo de Oliveira
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Roberto Lyra

* Que autoridade terá a sociedade para prevenir e reprimir crimes se, a tal pretexto, comete crimes maiores?
* Na realidade, os Códigos, os julgadores e a polícia, todo o conjunto, que se designa com o nome majestoso de justiça penal, está a serviço da classe dominante, que, por isso, é a poderosa.
* A Justiça não pode ser a reprodução desdobrada e ampliada do crime.
*A sociedade colhe o que planta. O criminoso é que estaria retribuindo. O poder que pune é o causador, por ação ou omissão, do efeito punido. Na reação, durante e depois, a sociedade, muitas vezes, excede os piores criminosos, depois de produzi-los.
* A prisão prejudica o indivíduo, a família e a sociedade. Multiplica-se ao máximo o mal do crime. A prisão é escola anormal de periculosidade, é curso de aperfeiçoamento celerado mantido pelo Estado.
Pensamentos de Roberto Lyra

Cristina Moreno de Castro

"Lotar as cadeias de sobreviventes do capitalismo ("lixos humanos", no subconsciente da maioria) é um jeito cômodo de garantir a proteção e o poder dos que detêm a maior parte dos bens. O desrespeito aos direitos humanos desses "lixos" não interessa. A indignidade a que eles são submetidos, tampouco. Eles nem mesmo são vistos como humanos! O que interessa é defender as fronteiras que separam o pequeno grupo dos ricos de uma imensa multidão de pobres. "
Do texto MUNDO CÃO no site NovaE
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Rudolf von Ihering

“Qualquer norma que se torne injusta aos olhos do povo, qualquer instituição que provoque seu ódio, causa prejuízo ao sentimento de justiça, e por isso mesmo solapa as energias da nação. Representa um pecado contra a idéia do direito, cujas conseqüências acabam por atingir o próprio Estado. Nem mesmo o sentimento de justiça mais vigoroso resiste por muito tempo a um sistema jurídico defeituoso: acaba embotando, definhando, degenerando.”
(A luta pelo direito)
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A lei que aumentou a violência

A Lei dos Crimes Hediondos confirma a tese de que não adianta majorar, tampouco endurecer o regime de cumprimento das penas. Antes, a omissão do Estado - desviando-se do bem comum, não proporcionando aos cidadãos condições mínimas de subsistência digna, no que se incluem objetivos fundamentais, como segurança, saúde, educação -, resultou no aprofundamento das desigualdades sociais - escara que a todos os brasileiros envergonha e humilha - cujo preço é o recrudescimento sem peias da violência urbana e até rural.
Marco Aurélio Mendes de Farias Mello - Ministro do STF
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Algemas, "London cabs", súmula vinculante*

Não se levantam os tribunais em defesa da humilhação do algemado desvalido "não perigoso" porque sua humilhação já precede a prisão. Ele já é humilhado por ser pobre, por ser destituído de camisas, gravatas e abotoaduras. A algema não grita, não cria contraste quando colocada num joão-ninguém.
JORGE BARBOSA PONTES, 48, delegado federal, é chefe da Interpol no Brasil e assessor internacional da Polícia Federal. Atua na área de cooperação internacional desde 1992.
* Artigo na FSP, 22/8/08
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Roberto Lyra

"A prisão visa a prevenir e a reprimir crimes.Ora, a prisão é causa de crimes.
A prisão justifica a oposição do preso à lei e à autoridade, cuja imagem está nos atos de seus órgãos e agentes. Aprende-se a iludir a lei depois de violá-la. Quando não copia a violência do criminoso, o Estado evolui como ele para a fraude, engendrando a disciplina astuta, cavilosa, traiçoeira, traficante, formando espiões e delatores, corrompendo homens que se comprometeu a regenerar."
Leia completo
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7 anos do Recomeço Mensagem

Parabéns, o jornal continua magnífico. Vocês são um exemplo para o Brasil. Grande abraço,
João Baptista Herkenhoff
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Juiz de direito do Estado do Espírito Santo, Dr. João Baptista Herkenhoff é um dos profissionais mais humanos da história do Brasil. Suas sentenças são verdadeiras obras primas. Mostra como um bom juiz pode fazer a diferença, sendo realmente justo, humano e conhecedor dos verdadeiros problemas que afligem o seu semelhante. João Baptista é um dos julgadores mais citados por defensores públicos e advogados pelo seu extraordinário desempenho e equilíbrio nas atividades institucionais, sendo o professor mais querido dos estudantes de Direito do ES.
Por Roberto Sávio
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Livro escrito pelo juiz de Direito Arruda Campos, publicado em 1959, atualmente em sua 4ª edição, contesta o cerco de proteção em volta do Judiciário. Defende que a população deveria ser chamada a escolher os representantes do Judiciário também, assim como acontece nos outros dois Poderes, para que os dirigentes de toga possam ser cobrados pela sociedade de seus atos. E, assim, sentirem-se obrigados a prestar um bom serviço e não contar apenas com o coleguismo e a antiguidade para serem promovidos. Hoje, o que acontece dentro do Judiciário é descrito por Arruda Campos dessa maneira: “Abre um incapaz, com o pescoço, a porteira do primeiro concurso, e ninguém o impedirá de chegar a desembargador”.
Fonte: site Consultor Jurídico
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Nobreza descoroada

Maura Roberti*

"Por menor que seja a privação da liberdade, ela representa hoje a ruptura com o trabalho, com a família, com o meio social, sendo certo que, pelo simples fato de ter uma mácula em seu antecedente (basta um simples inquérito policial), esse cerceamento da liberdade já representa um obstáculo à readaptação."
* Mestra em Direito Penal pela PUC-SP. Procuradora do Estado de São Paulo. Autora do livro A Intervenção Mínima como Princípio no Direito Penal Brasileiro.
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Agnès Callamard*

"Sentenciar à prisão alguém que escreve sobre possíveis violações aos direitos humanos é profundamente trágico. As condições das prisões são questões de política pública e claro interesse público. Elas devem ser investigadas, relatadas, debatidas e, finalmente, transformadas e melhoradas. Elas não devem ser escondidas. A ação de difamação contra Maria da Glória Costa Reis e a decisão são vergonhosas."
*Diretora executiva da ARTICLE 19
*A ARTICLE 19 é uma organização independente de direitos humanos que trabalha em diversos países na proteção e na promoção da liberdade de expressão e do direito à informação. Seu nome vem do artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que garante a liberdade de expressão.
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João Baptista Herkenhoff*

As classes dominantes desencorajam as lutas coletivas. Com freqüência, os líderes das lutas coletivas são perseguidos, presos e até mesmo assassinados.O povo tem de aprender a vencer seus desafios, com suas próprias forças. Mesmo que o ambiente envolvente seja adverso, mesmo que a luta coletiva não seja valorizada e enaltecida, é a união que faz a força.
* Jurista, professor e escritor do Espírito Santo - Grande exemplo de juiz e ilustre figura humana, que faz renascer nossa esperança nos homens públicos deste país.
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Antonio Veronese

“Há mais coisa entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã burguesia..."
“Mataram o moleque por causa de um pão de forma.Três tiros pelas costas e o bichinho estatelado ali, agarrado ao “pãnis-nosso-de-cada dia.”
“ A crítica, mesmo a mais contundente, pode ser uma forma aguda de amor...”
“ ...a nossa imprensa está cheia de fast-thinkers ou, como preferemos italianos, de “tutologos” : gente que lê os jornais pela manhã, consulta os alfarrábios à tarde, e vomita vã filosofia na edição do dia seguinte.”

Cultura e violência

Todo dia, dezenas de brasileiros são asfixiados em sacos plásticos, submetidos a choques elétricos, espancados. Neste ano, de acordo com as estatísticas oficiais, mais de 1.300 jovens foram mortos por policiais no Estado do Rio de Janeiro. Em São Paulo, cerca de 500. A maioria deles com sinais inequívocos de execução. Para ter uma idéia de quão estarrecedores são esses números, nos EUA, um país que tem 300 milhões de habitantes, a polícia mata cerca 200 pessoas por ano. O que nós brasileiros fazemos ante tamanha brutalidade?
JOSÉ PADILHA - cineasta, diretor dos filmes "Ônibus 174" e "Tropa de Elite".
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Nós, os sonsos essenciais

"Essa justiça que vela meu sono, eu a repudio, humilhada por precisar dela. Enquanto isso durmo e falsamente me salvo. Nós, os sonsos essenciais. A justiça prévia, essa não me envergonharia. Já era tempo de, com ironia ou não, sermos mais divinos; se adivinhamos o que seria a bondade de Deus é porque adivinhamos em nós a bondade, aquela que vê o homem antes de ele ser um doente do crime. Sobretudo uma justiça que se olhasse a si própria, e que visse que nós todos, lama viva, somos escuros, e por isso nem mesmo a maldade de um homem pode ser entregue à maldade de outro homem: para que este não possa cometer livre e aprovadamente um crime de fuzilamento.
Uma justiça que não se esqueça de que nós todos somos perigosos, e que na hora em que o justiceiro mata, ele não está mais nos protegendo nem querendo eliminar um criminoso, ele está cometendo o seu crime particular, um longamente guardado. Na hora de matar um criminoso - nesse instante está sendo morto um inocente. Não, não é que eu queira o sublime, nem as coisas que foram se tornando as palavras que me fazem dormir tranqüila, mistura de perdão, de caridade vaga, nós que nos refugiamos no abstrato. O que eu quero é muito mais áspero e mais difícil: quero o terreno."

( Clarice Lispector, da crônica "Mineirinho" - Livro Legião estrangeira)
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Jean Paul Sartre

As mãos sujas

Como tu prezas a tua pureza, meu filho! Que medo tens de sujar as mãos! Pois bem, fica puro! Quem é que aproveitará com isso, e por que é que vens então meter-te conosco? A pureza é uma idéia de faquir e de monge. Vocês, os intelectuais, os anarquistas e burgueses, utilizam-na como um pretexto para não fazer nada. Não fazer nada, ficar imóvel, apertar os cotovelos ao corpo, usar luvas. Pois eu tenho as mãos sujas. Até aos cotovelos. Mergulhei-as no sangue.

(Quinto quadro, cena III)
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Leonardo Isaac Yarochewsky

"Não é mais possível que homens e mulheres, condenados ou não, sejam colocados em depósitos infectos, pestilentos, insalubres, contagiosos e impróprios, até mesmo, para ratos. Até quando precisaremos levar sermões e puxões de orelhas das Organizações Internacionais em defesa dos Direitos Humanos? Até quando toleraremos que seres humanos sejam tratados como bichos? Até quando irá nossa insensibilidade? Até quando vamos fingir que vivemos em um Estado Democrático de Direito?"

Advogado Criminalista e Professor de Direito Penal da PUCMinas
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Carnificina no Rio

As seguidas carnificinas promovidas pela polícia
do Rio de Janeiro a as declarações legitimadoras desses dois “representantes do povo” (Sérgio Cabral e seu secretário de segurança) extinguiram qualquer possibilidade de uma ação anti-racista e includente. E o que outrora foram pregos e chicotadas agora são balas de fuzil da guarda do Pilatos do Palácio Guanabara.

Lenora Louro – Psiquiatra

Rogerio José – Historiador

(do artigo "O Pôncio Pilatos do Palácio Guanabara")

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Prisão medieval

A imagem do país no exterior se deteriora: entidades internacionais de defesa dos direitos humanos têm sistematicamente condenado as terríveis condições de vida dos presídios brasileiros. O sistema é visto como um rastilho de pólvora e fator de incentivo à violência. Não só pela desumanidade medieval que patrocina, mas pela absoluta ausência de interesse político em relação ao que acontece em seu interior.

Luís Francisco Carvalho Filho, do livro "A prisão"
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Opinião dos detentos

"Este jornal é a nossa voz escondida e oprimida. É também mudança, expressão, criatividade, e ao mesmo tempo oportunidade de aprendizado. Representa uma oportunidade de dizer que eu cometi um erro, mas não sou um monstro."
Detento D.V.N.

" Gosto do espaço que o jornal Recomeço dá ao detento, das pessoas que mandam mensagem dando parabéns pelo nosso trabalho, passando palavras positivas, as mensagens que são lindas, as lições de português... Gosto de tudo no jornal."
Detento A.L.S

"Para mim, o jornal Recomeço é uma forma para que eu possa refletir melhor a vida e recomeçar. E que eu possa alcançar a vitória, ajudando os caídos e ao próximo."
Detento A.P.O
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João Baptista Herkenhoff

"Não creio no poder da repressão. Creio no homem. Creio no respeito ao homem. Creio na igualdade entre os homens. Creio na palavra. Creio no contato entre seres humanos, na possibilidade da comunicação entre o homem que está sendo processado e o homem que, eventualmente, está sendo o juiz de seu irmão. Creio, sem pieguismo, no amor. E mais ainda creio na justiça, como valor supremo.Espero o mundo novo. Espero a nova sociedade, sem oprimido e opressores. Espero por estruturas sociais onde a miséria não arme o braço do crime, onde não se faça de cada homem um simples número para as estatísticas da sociedade de consumo.As estruturas sociais e econômicas vigentes é que são criminosas. No banco dos réus devia estar o sistema dominante, que gera o crime."

Do livro “Uma porta para o Homem no Direito Criminal” – Editora Forense, 2001
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Crime hediondo?

"Ninguém, neste país semi-milenar, sabe o que é um crime hediondo. Sabe-se apenas quais são os crimes que o legislador entendeu de rotular de hediondos, na medida em que a lei respectiva não definiu o conceito. Vale dizer, repetindo idéia nem um pouco original: o legislador brasileiro coseu um saco, no qual depositou o produto inicial de sua hedionda colheita, deixando aberta a larga boca do recipiente para ali ir armazenando, de acordo com os interesses da mídia e o humor dos poderosos, os frutos da plantação legislativa penal que se lhe afigurem atacados pela praga da hediondez."

Félix Valois Coelho
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Marta Bellini

Quando a gente lê o Recomeço, entramos em um mundo que nos é vedado pela imprensa, pela sociedade. Poucos, mas pouquíssimos de nós, somos capazes de imaginar que as pessoas encarceradas sejam pessoas mesmo. A imprensa, a polícia, a justiça, enfim a sociedade toda impõe-nos a representação do(a) encarcerado(a) como aquele(a) que não tem alma, não é pessoa, é bicho. Na TV, os programas de final de tarde, sensacionalistas, fazem a versão do bicho homem. O jornal de vocês - pequeno jornal diante dos monstros da TV e jornais diários - mostra a face humana de todos nós, seres humanos. Parabéns para todos os escritores do jornal.

Marta Bellini (blog)
(Univ. de Maringá - PR)
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Kafka e o judiciário

"O grande organismo judiciário estava sempre presente de algum modo e que tentar modificar alguma coisa seria como suprimir o chão de sob os pés, correndo-se grande risco de cair, enquanto o imenso organismo podia facilmente, sempre se apoiando no seu sistema, encontrar uma peça de substituição e ficar como antes, a menos – e isso era o mais provável – que não se tornasse ainda mais vigoroso, mais atento, mais severo e mais malvado."

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" E qual o sentido dessa grande organização, senhores? Prender inocentes e mover-lhes processos sem razão e, na maioria das vezes, sem resultado, como no meu caso. Como seria possível, no absurdo do conjunto de um sistema como este, que a venalidade dos funcionários não viesse à luz?"
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" Uma organiação que não apenas emprega guardas corruptos, inspetores e juizes de instrução imbecis, mas também tem ao seu dispor uma hierarquia judiciária de um nível elevado, aliás do mais elevado nível, com o seu indispensável e numeroso séquito de empregados, funcionários, policiais e outros auxiliares, talvez até carrascos - e não estremeço ao pronunciar esta palavra."

Do livro "O Processo"

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O que se espera do Judiciário

"Alguns setores do Judiciário evidenciam uma notável dificuldade de captar a gravidade da situação brasileira. O apego à letra da lei está bloqueando o fluxo de oxigênio que pode salvar o paciente. O que se espera do Judiciário não é apenas que seja um zeloso aplicador da letra da lei. Isso é muito, mas é pouco. O que se espera dos nossos magistrados é uma fina capacidade de discernimento, uma delicada sensibilidade para fazer justiça interpretando a lei. A gravíssima epidemia de corrupção está a exigir uma corajosa revisão de rotineiros e cristalizados procedimentos. Ou o Judiciário compreende a gravidade da situação e a força da demanda social ou será atropelado."

Carlos Alberto Di Franco, Professor de ética e doutor em comunicação pela Universidade de Navarra (Espanha)
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Wikipedia

1 de abr. de 2010

Edição 162 do Recomeço impresso (no site)

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