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5 de fev. de 2009

VITÓRIA SOBRE O ESTADO POLICIAL

Fim do sigilo

Leonardo Isaac Yarochewsky - advogado criminalista, professor de direito penal da PUC Minas
O Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou dia 2, na primeira sessão do ano judiciário, por nove votos a dois súmula vinculante que garante aos advogados acesso a provas já documentadas em autos de inquéritos policiais que envolvam seus clientes, inclusive os que tramitam em sigilo.
A 14ª Súmula Vinculante diz o seguinte: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”. A questão foi levada ao plenário a pedido do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio do processo Proposta de Súmula Vinculante (PSV), instituído no STF em 2008.
Essa foi a primeira PSV julgada pela corte. Dos 11 ministros do STF, apenas Joaquim Barbosa e Ellen Gracie foram contra a edição da súmula por entenderem que a matéria não deveria ser objeto de súmula vinculante. A Procuradoria-Geral da República também se manifestou contrária à edição da súmula, tendo o vice-procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmado que ela causará um “embaraço indevido do poder investigativo do Estado”, podendo até inviabilizar o prosseguimento de investigações.
Contudo, e felizmente, prevaleceu o entendimento de que a súmula proposta, como bem disse o ministro Celso de Mello, “qualifica-se como um eficaz instrumento de preservação de direitos fundamentais”. Com a edição da 14ª Súmula Vinculante, caso seja negado acesso ao advogado do que consta da investigação contra seu cliente, ele poderá recorrer diretamente ao STF, por meio de reclamação. Antes da aprovação da súmula o advogado deveria percorrer, quase sempre, a todas as instâncias até chegar ao STF, via habeas corpus.
O STF já havia firmado entendimento de franquear aos advogados acesso aos autos do inquérito e do processo. Destaca-se que a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB) em seu art. 7º, XIII e XIV, confere ao advogado o direito de examinar os autos do processo nas repartições do Poder Judiciário e, ainda, os autos de inquérito policial em qualquer repartição policial. A Constituição Federal, nossa lei maior, em seu art. 5º, LV diz: “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. É evidente e elementar que para que alguém se defenda de uma acusação saiba do que está sendo acusado e das provas que dizem constar contra ele.
Cesare Beccaria, em 1764, no seu clássico livro Dos delitos e das penas, já criticava as acusações secretas. Segundo ele, “as acusações secretas constituem abusos evidentes, mas consagrados e necessários em muitas nações pela fraqueza da Constituição. Esse costume torna falsos e dissimulados os homens”.
Marquês de Beccaria indaga: “Quem pode defender-se da calúnia quando ela se arma com o mais forte escudo da tirania, o segredo? Que espécie de governo é esse o regente suspeita ver em cada súdito um inimigo e, para assegurar o sossego público, é obrigado a tirar o sossego de cada qual?”
A edição da 14ª súmula vinculante foi uma vitória do Estado de direito sobre o Estado policial.
Fonte: jornal Estado de Minas - Seção Opinião - 5/2/09

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