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29 de dez. de 2007

Exemplo de Ministro

Corregedor do CNJ tira juiz de casa e manda soltar inocente
Depois de saber, por uma reportagem de TV, que o caminhoneiro Aparecido Ferreira Batista estava preso há mais de 60 dias injustamente, conseguiu um Habeas Corpus, mas só seria libertado depois das festas de final de ano, o ministro Cesar Asfor Rocha, do Superior Tribunal de Justiça e corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), decidiu arregaçar as mangas. Passou o sábado (22) inteiro no telefone até conseguir que ele fosse libertado.
O acusado nunca foi para o nordeste em toda a sua vida, mas respondia a três processos no estado, por desvio de carga.“Embora eu reconheça que este não seja um caso isolado no país, me chamou atenção por ser uma pessoa que tem direito à liberdade e continuava presa por um ato de burocracia processual”, conta o ministro.
Segundo Asfor Rocha, o alvará de soltura já tinha sido expedido pela Comarca de Jaboatão dos Guararapes, mas ainda não tinha chegado ao juiz de Santa Bárbara d’Oeste(SP), onde estava preso, porque o sedex não chegou. Hoje, Batista está em casa e vai passar o Natal com a família.
Em 1999, o caminhoneiro perdeu todos os seus documentos em Uberlândia, emMinas Gerais. O boletim de ocorrência teve de ser apresentado muitas vezes para mostrar que também era vítima, diante das cartas de cobrança que recebia de lojas do país inteiro. Em 2000, apareceu como réu em dois processos em Pernambuco, em que era acusado de desvio de cargas. Em 2001,outro com a mesma acusação no mesmo estado. A empresa em que trabalha contratou a defesa, depois de constatar que no dia do crime ele estava voltando de Brasília para São Paulo.
Toda a história de Aparecido Ferreira Batista foi contada pela Jornal doSBT, na madrugada de sexta-feira (21). Depois de tanto azar, o caminhoneiro teve a sorte de o ministro Cesar Asfor Rocha estar diante da televisão e não se conformar com a história. A defesa do caminhoneiro conseguiu um HabeasCorpus em seu favor, na quinta-feira (20), mas para ganhar liberdade ele teria de esperar o juiz da Comarca de Jaboatão dos Guararapes voltar de seu recesso, no dia 10 de janeiro de 2008, e encaminhar cópia do alvará desoltura ao juiz de São Paulo.
Na manhã do dia seguinte, Asfor Rocha ligou para o corregedor de Justiça de Pernambuco, para o corregedor de Justiça de São Paulo e diversas outras. O desembargador de Pernambuco foi até o Fórum e conseguiu encontrar o processo. Descobriu que o alvará já tinha sido expedido, mas não chegava a Santa Bárbara d’Oeste. Por fax, o ministro Asfor Rocha recebeu uma cópia eencaminhou ao Fórum da cidade paulista. O corregedor de São Paulo encontrou o juiz da comarca paulista e fez cumprir a decisão.
Batista estava preso desde 22 de outubro em Santa Bárbara d’Oeste, na regiãode Campinas, em São Paulo. O presidente da Comissão de Direitos Humanos daOAB de Recife já estava na luta pela liberdade do caminhoneiro. Um simples ato processual estava impedindo que o caminhoneiro fosse libertado. “Todas as medidas foram adotadas neste sábado (22) para que a Justiça estivesse funcionando como num dia comum”, disse o ministro.
(A matéria é de autoria da repórter Lilian Matsuura e foi publicada no site Consultor Jurídico em 23/12/07)

28 de dez. de 2007

João Baptista Herkenhoff

Cidadania: olhar para o futuro sob a luz de um Ano Novo

A cidadania há de ser conquistada através da luta individual e através da luta coletiva.
Há situações concretas onde o cidadão tem de travar uma luta individual para conquistar seus direitos.
Esta luta individual, solitária, que o cotidiano da vida às vezes exige, é sempre dura e difícil.
A luta individual é mais penosa, mais longa, com possibilidade de êxito menor. Porém, se uma situação concreta reclama a luta individual, não devemos recuar diante dos obstáculos.
Podemos renunciar a um direito por generosidade, jamais por comodismo ou apatia. Dou o exemplo: posso rasgar um documento de crédito, de que sou titular, se o devedor encontra-se numa situação aflitiva, porque o homem não pode ser lobo de outro homem. Neste ponto discordamos de Rudolf von Ihering que, na sua obra clássica “A luta pelo Direito”, não admite a renúncia a direitos.
Sempre que for possível, devemos recorrer à luta coletiva.
Imaginemos uma situação na qual várias pessoas têm um mesmo interesse a defender perante a Justiça. Ora, será muito mais prático que se juntem para uma ação em comum do que cada um lutar separadamente.
Pela Constituição de 1988, os sindicatos, as entidades de classe, as associações, os partidos políticos podem ingressar coletivamente em Juízo em favor de centenas ou milhares de pessoas.
Para a luta coletiva, em seus diversos níveis, a sociedade tem de aprender a organizar-se. Os pleitos que se formulam de maneira atabalhoada não são vitoriosos. O planejamento, a discussão, a partilha dos problemas, a montagem de uma estratégia de luta – este me parece ser o caminho para o bom encaminhamento das causas que envolvem muitos.
Se a organização autônoma da sociedade é indispensável aos avanços sociais e às pugnas em prol da Cidadania, nem por isso o Poder Público está dispensado de fazer sua parte.
Numa sociedade democrática, os Poderes Públicos estimulam, encorajam e apóiam todo o esforço que se desenvolva no sentido da consolidação da Cidadania. Daí a importância da criação de Conselhos de Cidadania e Direitos Humanos, por iniciativa governamental, no âmbito federal, estadual ou municipal.
Também quando se trata de uma luta extrajudicial (isto é, uma luta fora da Justiça), será sempre mais eficaz a luta coletiva.
Um provérbio popular resume tudo isto que estamos dizendo:
“Uma andorinha só não faz verão”.

As classes dominantes desencorajam as lutas coletivas. Com freqüência, os líderes das lutas coletivas são perseguidos, presos e até mesmo assassinados.

O povo tem de aprender a vencer seus desafios, com suas próprias forças. Mesmo que o ambiente envolvente seja adverso, mesmo que a luta coletiva não seja valorizada e enaltecida, é a união que faz a força.
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João Baptista Herkenhoff é Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo.

27 de dez. de 2007

Absurdos da Justiça

Justiça julga Habeas Corpus para morto
Leia notícia sobre a "eficiência" inútil da justiça, tão dispendiosa ao contribuinte brasileiro: habeas corpus para um morto chega ao STF.
Veja notícia completa com a decisão da ministra Cármen Lúcia no Consultor Jurídico:
Judiciário se movimenta para garantir liberdade de morto
por Aline Pinheiro

Um pedido de Habeas Corpus em favor de um preso que já morreu, e que se vivo estivesse já teria cumprido sua pena, acaba de ter uma decisão na mais alta corte de Justiça do país.
A ministra Carmem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, estranhou estar apreciando em 2007 o pedido de Habeas Corpus do preso, que em outubro de 2005 foi condenado a nove meses de prisão. Pediu informações, então, ao juízo de primeira instância, de Santo Ângelo (RS), e só então se ficou sabendo que o impetrante já estava morto desde agosto de 2006.
Antes de chegar ao pedido de informação da ministra, o paciente já havia sido beneficiado com uma liminar da própria Cármen Lúcia, em outubro último, e passara pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
O delito, que causou tamanha repercussão nas diversas instâncias do Judiciário brasileiro, foi um furto, com agravante de ter sido cometido durante o repouso noturno. O autor do crime, Jorge César Vieira de Lima, foi defendido pela Defensoria Pública do Rio Grande do Sul em primeira e segunda instância e pela Defensoria Pública da União, quando o caso avançou para o STJ e o STF.
A ministra indignou-se com a eficiência inútil dos vários órgãos que trataram do caso até que ele chegasse ao Supremo: “Tanto o Superior Tribunal de Justiça quanto a atuação da Defensoria Pública acionando este Supremo Tribunal Federal deram-se sobre um defunto”, admirou-se.
Cármen Lúcia lembrou que os tribunais já estão abarrotados de processos de seres vivos. “E, para tanto, o que mais falta é tempo”, disse. E acrescentou: “Não compete aos tribunais superiores estar a buscar dados primários e imprescindíveis para que uma ação possa ter seguimento, que dirá para ser proposta”.
A ministra lembrou que, sem a informação do juiz de Santo Ângelo, o pedido de Habeas Corpus teria chegado às últimas conseqüências: os ministros do Supremo teriam, juntos, discutido e analisado a possível liberdade de um morto.
Procurada pela Consultor Jurídico, a assessoria de imprensa da Defensoria Pública da União explicou que a DPU só atua no processo quando este chega aos tribunais superiores e ao Supremo. Portanto, não teria como saber se o réu estava vivo ou morto. Segundo a assessoria, o Ministério Público gaúcho recorreu ao STJ e, quando o TJ remeteu o processo para o superior, o condenado já estava morto. Se houve erro, portanto, foi da base, informou.

26 de dez. de 2007

Edição 138

Leia a edição 138 do jornal impresso, com os textos dos detentos, no site do jornal Recomeço. Nesta edição, todos os textos e o resultado do concurso de Mensagens Natalinas realizado com os internos da cadeia de Cataguases.

Polícia Pit Bull

As mortes de Carlos
Os índios caetés, que devoraram o bispo Sardinha em 1556, são os antepassados culturais dos seis policiais que mataram o garoto de 15 anos depois de torturá-lo com choques elétricos
De André Petry
A primeira morte de Carlos Rodrigues Junior, adolescente de 15 anos, aconteceu na madrugada de sábado 15, em Bauru, no interior de São Paulo. Seis policiais entraram na casa do garoto, em plena madrugada, foram até seu quarto e lá ficaram por uma hora e onze minutos. O rapaz foi torturado com choques elétricos, enquanto sua mãe e sua irmã ficavam na sala, impedidas de entrar no quarto, escutando seus gritos e gemidos. Carlos era suspeito de roubar uma moto. Não tinha ficha policial. O laudo do Instituto Médico-Legal encontrou em seu corpo trinta marcas de choques elétricos, duas no coração, além de escoriações no rosto e no tórax. Na viatura dos policiais, havia um fio elétrico.A segunda morte de Carlos deu-se nos dias subseqüentes. A notícia saiu aqui e ali, mas tratada quase com a leveza da rotina. O presidente Lula estava ocupado demais para tratar de um assunto que não lhe rende votos e, afinal de contas, ocorreu no estado de seu amigo imaginário, o governador José Serra. O próprio governador disse que o caso mostrava uma "brutalidade inaceitável", e mais não fez nem disse. Enviar condolências à família? Não se teve notícia disso. Participar do enterro, ir ao velório? Também não se soube disso. Mostrar de algum modo, com a presença física, que o inadmissível aconteceu? Nem pensar. Serra preferiu seguir um modelito mais ou menos parecido com o implantado pela governadora Ana Júlia Carepa, do Pará, quando da descoberta da menina enjaulada com um bando de marmanjos. Só não culpou o passado e os antecessores porque não dá.Os índios caetés, que devoraram o bispo Sardinha em 1556, são os antepassados culturais dos seis policiais.
Pois hoje, na terra dos ex-selvagens e na entrada do terceiro milênio, o recado é o seguinte: o brasileiro Jean Charles de Menezes, assassinado com oito tiros pela polícia inglesa ao ser confundido com um terrorista, é um absurdo. Não pode. Mas os ingleses precisam entender que nós mesmos podemos fazer esse trabalho com os nossos. A prisão de Abu Ghraib, cadeia que se tornou símbolo das atrocidades de Saddam Hussein, que também virou símbolo da tortura e da humilhação infligidas pelos soldados americanos aos presos iraquianos, é um escândalo. Mas, no Brasil, nós mesmos nos encarregamos de fazer isso com os próprios brasileiros.No velório de Carlos Rodrigues Junior, sua mãe, Elenice Rodrigues, percebeu que o filho estava com os dedos quebrados. O advogado de um dos policiais também compareceu ao velório, só que acompanhado do cidadão que teve sua moto roubada. O motivo da visita era reconhecer o assaltante. O ladrão, disse a vítima, era mesmo o garoto Carlos Rodrigues. Pronto. Como era aparentemente culpado, eis o que basta para que muitos entendam que a tortura, afinal de contas, foi merecida. É exatamente assim que se constrói a barbárie.
À família de Carlos Rodrigues Junior, ainda que isso não sirva nem como consolo tardio, vai aqui, neste texto, pelo menos a lembrança de uma injustiça impressa no papel. Um papel que, se quisermos, podemos usar para forrar a gaiola do passarinho, enrolar o peixe de amanhã ou simplesmente rasgar.
(Publicado no Marta Bellini)

25 de dez. de 2007

Sistema cruel


(Matéria na Folha de São Paulo, 25/12, Cotidiano)

Cela lotada em Florianópolis (SC); no país, é comum detentos em situação provisória e condenados dividirem o mesmo local

1/3 dos presos está em situação provisória
Em todo o país, 120,1 mil detentos ainda aguardam julgamento ou recurso de suas sentenças, segundo dados do Ministério da JustiçaPresos que poderão até ser considerados inocentes dividem penitenciárias superlotadas com outros detentos já condenados
Herminio Nunes - 4.dez.2007/Agência RBS

Superlotado, o sistema penitenciário brasileiro conta com 32% de seus presos em situação provisória -caso dos que ainda aguardam julgamento ou algum tipo de recurso em suas sentenças penais. Nos 1.119 estabelecimentos penais do país é comum detentos provisórios e condenados dividirem cela.No Brasil, dos 377,9 mil presos, 120,1 mil são provisórios, segundo levantamento do Ministério da Justiça de junho -o último disponível e que não inclui dados de todos os estabelecimentos penais do país, mas de 1.055. Não foram computados os presos em delegacias. Segundo a Constituição, a administração penitenciária é responsabilidade dos Estados.Tabulados pela Folha, os dados revelam um percentual ainda maior entre as mulheres. A média de presas provisórias é de 46%. Alagoas (87%) e Pará (69%) lideram esse ranking.Além do fato de, ao serem julgados, os presos provisórios poderem até ser inocentados, a situação e a acomodação deles também está atrelada à superlotação das prisões.No Brasil, há 233,5 mil vagas para 338,8 mil presos, excluindo dessa conta aqueles em regime aberto. Isso representa 1,45 preso para cada vaga nos estabelecimentos penais. Na região Norte, a média chega a 3,56 presos/vaga.
Lentidão e descaso
Especialistas e entidades ouvidos pela reportagem apontam a lentidão da Justiça, o descaso das autoridades e a falta de defensorias públicas equipadas como as principais causas dos problemas.O volume de provisórios, aliás, tende a ser ainda maior se forem computados os presos amontoados em delegacias de polícia pelo país afora -como foi o caso da adolescente L.,15, que sofreu abuso sexual numa cela masculina em Abaetetuba, no interior do Pará.O uso de carceragem em delegacia é proibido pela legislação. A lei determina que os provisórios devem aguardar o julgamento em cadeias públicas."Os Estados, em sua maioria, não têm defensoria pública equipada e com capacidade para fazer a defesa dessas pessoas, que já deveriam estar soltas ou, ao serem detidas, não poderiam estar misturadas com os já condenados", afirma Cezar Britto, presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).Nas regiões, o maior percentual de provisórios está no Norte (40%), seguido de Nordeste (40%), Sudeste (34%), Centro-Oeste (31%) e Sul (21%).No Norte, a escassez de defensores públicos e a dificuldade de acesso aos municípios, muitas vezes somente via barcos ou aviões de pequeno porte, colaboram com a demora dos julgamentos.Coordenador nacional da Pastoral Carcerária, o padre Gunther Zgubic afirma que os gastos dos Estados na manutenção de cada um desses presos provisórios, às vezes por anos e anos, poderiam ser revertidos ao Judiciário."Se os governos estaduais, num acordo com os tribunais [de Justiça], injetassem mais dinheiro na agilização da Justiça, com mais defensores, promotores, juízes e varas equipadas, teríamos julgamentos mais rápidos e, com o mesmo dinheiro, muito menos presos provisórios", afirmou.
Encarcerar para punir
O pesquisador Fernando Salla, do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, avalia que o excesso de provisórios no sistema prisional também se deve ao pensamento comum de que é preciso encarcerar para punir."Os dados são suficientes para mostrar que a repressão e o rigor com relação a pequenos delitos têm um enorme peso. São coisas que podem ser resolvidas facilmente", afirma.Para o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Sérgio Mazina, a polícia prende em excesso."Essa é uma lógica policialesca, extremamente nociva à sociedade, mantendo presas pessoas que não devem ser condenadas e vivem na prisão a um preço altíssimo", declara.A manutenção de um preso custa mensalmente de R$ 900 a R$ 1.000 aos cofres públicos.

A lei brasileira diz que os acusados de crime só responderão a processo sob custódia em três situações: 1) quando há provas de que o acusado pretende fugir; 2) quando houver provas de que o suspeito atrapalha o processo, pressionando testemunhas, por exemplo; e 3) quando há provas de que o preso coloca a sociedade em risco.
(Nota: notícia na íntegra)

23 de dez. de 2007

O cartaz e a sarna

Cartaz na porta do Fórum de Leopoldina, MG
Na prisão não tem nada "arrumadinho". Os presos ficam em estado de extrema penúria. Não recebem material de limpeza e higiene, não recebem serviços de saúde, educação e trabalho (prescritos na lei), e lazer, nem pensar.
A maioria não dispõe de vestuário como calça, camisa, e muitos, nem um chinelo. Mas quando são chamados ao Fórum, têm de ir "arrumadinhos", como reza o aviso na porta da casa da Justiça. Fiquei curiosa para saber como fazem diante dessa exigência de vestuário. Perguntei. Resposta: roupa emprestada. Os que têm uma calça, emprestam aos que vão ao Fórum.
Isso num lugar infestado de escabiose, no bom português: sarna, cujo maior contágio é através do contato com roupas contaminadas.
Isso não é um problema só dos presos, é um problema de saúde pública. O ácaro da sarna não tem preconceito, é um parasita totalmente democrático, afeta pessoas de todas as etnias e classes sociais. A sarna espalha-se rapidamente em ambientes cheios de gente onde o contato pele-a-pele é freqüente, como em hospitais, instituições, creches e orfanatos. Diz o médico Drauzio Varella que a escabiose é uma infestação altamente contagiosa, conhecida milenarmente, sabendo-se que todas as populações, na Idade Média, tinham sarna.
Esclarecimento sobre a "sarna"
A escabiose ou sarna é uma doença parasitária, causada pelo ácaro Sarcoptes scabiei. É uma doença contagiosa transmitida pelo contato direto interpessoal ou através do uso de roupas contaminadas. As roupas de uso diário e as roupas de cama devem ser trocadas todos os dias, colocadas para lavar e passar a ferro. Todas as pessoas da casa que tiverem qualquer tipo de coceira devem se tratar ao mesmo tempo, para evitar a recontaminação. As unhas devem ser escovadas com sabonetes apropriados para a retirada de parasitas ali depositados pelo ato de coçar. Para evitar a doença não use roupas pessoais, roupas de cama ou toalhas emprestadas, evite aglomerações ou contato íntimo com pessoas de hábitos higiênicos duvidosos.

Conclusão
- Todas as autoridades ligadas ao sistema carcerário sabem que as cadeias e presídios brasileiros estão infestados de "sarna". Mas, como sói acontecer, fazem ouvidos de mercador. Assim será, até que nos tornemos, em pleno século XXI, uma população da idade média infestada de sarna.
- Quanto ao cartaz proibindo as pessoas pobres de entrar no fórum, cabe repetir a famosa frase de Millôr Fernandes: "No Brasil, as únicas portas que estão sempre abertas a toda a população abaixo da classe média são as da cadeia."
O cartaz na porta do fórum deveria conter outra proibição, voltada para o "administrador" e não para o povo: "É terminantemente proibida a entrada nas dependências do Fórum de pessoas sem consciência e trajando o traje da burocracia, insensibilidade, indiferença e do ritualismo com a vida humana".

21 de dez. de 2007

O paradoxo do ministro

O ministro do STF, Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, recebeu, dia 20/12, o 25º Prêmio Franz de Castro Holzwarth de Direitos Humanos, entregue pela Ordem do Advogados do Brasil, seção São Paulo. Como postei mais abaixo, na entrega do prêmio, ele fez um discurso primoroso destacando o desrespeito aos Direitos Humanos no Brasil, principalmente ao referir-se às atrocidades do nosso sistema penal e carcerário. Até aí, maravilha! Mas, novamente, diante do discurso na íntegra (como segue publicado nesta postagem), intriga-me a fala do ministro como se toda essa barbárie não fosse responsabilidade também, e até principalmente, do poder a que ele pertence: o Judiciário.
O ministro culpa e ataca o "Estado", como se ele não fosse um dos seus integrantes. E o ministro, repetindo a História, lava as mãos, sem nem mesmo a leve hesitação de Pilatos, o representante do sistema penal romano ao condenar Cristo à morte, tal qual é condenado cada brasileiro jogado em nossos - nas palavras do ministro - "tenebrosos calabouços medievais".
Se um ministro do STF pergunta " a quem recorrer", o que resta a nós, cidadãos?
Leiam o discurso do ministro:
Senhores,
Há pouco, há bem pouco tempo, manchetes veicularam, com o estardalhaço ufanista de praxe, a notícia de que o País fora promovido, por decisão da Organização das Nações Unidas, ao patamar daqueles com alto índice de desenvolvimento humano. Ainda no calor das comemorações, entretanto, O Globo divulgou fato dos mais humilhantes para governos com pretensões progressistas: 52% dos menores presos ou são mortos nos cárceres disfarçados de centros de ressocialização ou, livrando-se soltos, retornam à prática delituosa.Antes, celebrou-se com fogos e bravatas de nuances hegemônicas, além da auto-suficiência em petróleo, a descoberta de colossal jazida do óleo na região de Santos, a elevar-nos à condição de "magnata do ouro negro", com reivindicado assento na Opep, a organização que congrega os sultãos que o produzem.
Na outra ponta dessa bússola, na Amazônia tão distante dos palácios governamentais, índios perecem como moscas. Morrem de fome ou suicidam-se, porque o alcoolismo, a miséria, o descaso de quem os devia amparar já lhes ceifaram toda esperança, a exemplo dos 831 indígenas encontrados, nas mais degradantes condições, em trabalho escravo no Mato Grosso do Sul, na Fazenda Brasilândia, de propriedade de um dos conselheiros do Instituto Ethos, cuja proposta é justamente estimular a responsabilidade social das empresas brasileiras.
Para muitos, contudo, o que são todas essas mazelas humanas se o Brasil não tarda em obter o tão sonhado grau de investimento, a senha para a entrada no seleto rol dos países desenvolvidos e, quem sabe, o passaporte para um assento no Conselho de Segurança da ONU. Somos grandes! A sanha do capital externo se exacerba diante da quebra de outro recorde nacional - mais de 33 bilhões de dólares de investimento estrangeiro foram injetados na economia brasileira até o mês passado, o fatídico novembro em que o mundo soube, estarrecido, que uma jovem de 15 anos foi trancafiada, sob a acusação de furto de um celular, com mais de 20 homens durante longos 26 dias, nos quais foi molestada sexualmente, além de espancada e queimada com pontas de cigarros.
Cúmplices da tortura, policiais não satisfeitos em presenciar o espetáculo de horrores ainda o filmaram, ao tempo em que olvidaram os gritos e apelos da adolescente por comida. Descoberta a barbárie, ameaçaram de morte vítima e família. A notícia vazou e, então, nova encenação de auto-engano tomou conta do enredo, agora com agentes públicos na berlinda.
Falemos sério: há o que comemorar no Brasil-potência? Sevícias, torturas, execuções, abuso de autoridade, extorsão; policiais corruptos, autoridades negligentes, servidores envolvidos com a criminalidade mais repugnante. O que causa perplexidade é que, de escândalo em escândalo, de barbárie em barbárie, a atingir tanto delegacias e presídios quanto os grotões mais miseráveis, palcos da prostituição e do tráfico de drogas, o próprio Estado aparece cada vez mais como partícipe, por ação ou omissão, por desconhecimento ou despreparo, por negligência, comodidade ou conformismo.
Quando se cuida de acusados por algum delito - por menor que seja, não importa -, ao Estado brasileiro parece justificar-se um tratamento penoso, declinando de atenção mais acurada aos direitos humanos, numa lógica das mais perversas, a do "bem feito"!É como se, desrespeitadas as regras de convivência social, fizesse parte do jogo deportar o desgraçado que claudicou para os mais tenebrosos calabouços medievais, como aquela delegacia na capital catarinense onde 5 presos preferiram ser acorrentados do lado de fora da cela porque, apesar de não tomarem banho e ficarem obrigados a satisfazer as necessidades em garrafas e sacos plásticos, pelo menos não teriam que suportar o cheiro de suor e a poeira ou dormir uns por cima dos outros, já que do privilégio de dormir sentado no vaso sanitário assenhorearam-se outros três. Na cela para 4, espremem-se 17. Escolheram bem os 5 que optaram por correntes nos pés, renunciando à condição de humanos. Pelo menos tiveram direito ao vento que areja o corredor da delegacia catarinense.
Sob esse ângulo, parece claro que a mentalidade reinante é a de puramente castigar, e não recuperar. Os métodos, em certos casos, fariam enrubescer nazistas. Na época de exceção, os torturadores legitimavam as mais terríveis selvagerias com panacéias ideológicas. E hoje, o que justifica tanto desprezo pelos mais básicos direitos humanos, pela humanidade de quem delinqüiu?
País de contrastes evidentes, por aqui a população como que se mostra acostumada com os paradoxos, quando não os cultua, sob a rubrica muito em voga de "diversidade", que em tempo algum, jamais, viabiliza o benefício das classes mais pobres. Na base da pirâmide, grassa o racismo, a discriminação, os depoimentos extorquidos. Ou não se trata de tortura o amontoamento de gente como se fosse gado em cadeias imundas, sem luz, sem banheiros, sem ar, sem comida, sem um mínimo de dignidade, depósitos fétidos em que presos cumprem pena sem passarem por um julgamento sequer?
À vista desse quadro tão pouco surpreendente, chega-se com facilidade à conclusão de que é o próprio Estado brasileiro que desonra a Constituição Federal, em cujo artigo 5° - o das garantias individuais - assegura-se que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; que a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do acusado; que aos presos é devido o respeito à integridade física e moral.
Sendo assim, a quem recorrer? Não há falar-se em intromissão, em afronta à soberania interna, quando, apanhados em flagrante, expostos à reprovação internacional, repercutem as reprimendas do Alto Comissariado da ONU sobre a falta de compromisso no tocante à ratificação de quatro convenções daquela organização mundial - relativas exatamente a direitos humanos, tortura, direitos dos deficientes e das pessoas desaparecidas -, sobretudo em face do recorrente e ostensivo desrespeito aos tratados já assinados. Com respaldo em acontecimentos como o das execuções no Morro do Alemão, no Rio de Janeiro, ou nas denúncias de depoimentos viciados, arrancados à força, representantes da ONU acham-se confortáveis para palpitar em assuntos da economia interna brasileira, a exemplo da recente recomendação de que sejam instaladas nos presídios e delegacias câmaras de segurança de modo a viabilizar, entre outros procedimentos, a gravação de interrogatórios.
Não há o que retrucar quando o algoz é o próprio Estado. Se, como cidadãos, os brasileiros não são respeitados por quem tem o dever de protegê-los, então que o faça uma entidade estrangeira, sob o argumento irrefutável da simples humanidade que ampara e distingue cada qual, pouco importando a natureza do desvio de conduta ocorrido.
No dia em que se completam 60 anos da Declaração dos Direitos Humanos - solene e prontamente endossada pelo Brasil -, afigura-se mais do que pertinente refletir sobre qual tipo de nação almejamos para os próximos 60 anos. Pois o que vem a ser efetivamente o progresso senão o bem-estar de todos ou, pelo menos, da maioria?
De que serve um PIB maior que o da Índia ou da Rússia se a imensa população de miseráveis vê-se excluída da rede de proteção social do Estado e, portanto, privada de serviços básicos como o acesso a saúde, educação, segurança e até esgoto! Por quanto tempo ainda o Brasil ostentará, sem demonstrar preocupação ou vergonha, o título de líder em concentração de renda, mesmo que a ninguém mais escape a certeza de ser a pobreza tanto causa como conseqüência da violação de direitos humanos?
Honra-me sobremaneira receber um prêmio como este. Orgulha-me a companhia de brasileiros tão ilustres, alguns cuja vida foi dedicada inteiramente à causa dos direitos humanos, mormente num país em que tais garantias são confundidas com "mimos" à "bandidagem", premissa a decorrer mais da falta de esclarecimento quanto à necessidade de ressocialização dos infratores, postos sob a tutela estatal não para serem barbarizados mas a fim de retornarem recuperados ao convívio pacífico na sociedade.
Com doses maciças de educação, não tarda que se resolvam esses mal-entendidos. A inobservância da cláusula constitucional que impõe ao Estado proporcionar ensino fundamental obrigatório e gratuito a todos, com a progressiva universalização do ensino médio gratuito, com acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, sem falar no atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos, é suprida graças ao esforço de idealistas do porte do Professor Edevaldo Alves da Silva, aqui presente e que capitaneia o grupo educacional FMU de maneira despojada e voltada a propiciar aos alunos formação suficiente ao enfrentamento do impiedoso mercado de trabalho. Disso, como professor do grupo, sou testemunha, sendo exemplo encontrarem-se nesta sala egressos das Metropolitanas, inclusive - e eis ímpar destaque -, o diligente, o combativo advogado e Presidente desta Seccional - o Dr. Luiz Flávio Borges D'urso. Surge a valia da opção do constituinte de 1988 pela ênfase ao setor privado, fenômeno que certos homens públicos fingem desconhecer e, em vez de promoverem incentivos, criam obstáculos - diretos e indiretos -, dificultando o acesso ao ensino superior, como se este já fosse viável em larga escala consideradas faculdades públicas. Nesse ponto, o Brasil, comparado com outras nações, até mesmo da América Latina, caminha a passos lentos. Percentual ínfimo dos alunos que completam o ensino fundamental chega ao ensino superior.
Senhores, mais satisfeito ficarei no dia em que distinção como esta da qual sou alvo vier a tornar-se desnecessária, porque entranhada, nas instituições e em cada qual dos brasileiros, a devida atenção, o acatamento incondicional aos direitos humanos, como forma coerente de atingir, além do objetivo maior do Estado - o bem-estar de todos, a tão almejada paz social -, o respeito inconteste - e não apenas na esfera econômica - de toda a comunidade internacional. Oxalá não se afigure esse sonho mera utopia, mas realidade que se avizinha próxima e definitiva.Muitíssimo obrigado!

Meu presente de Natal

Aos leitores do Recomeço

Paco de Lucia - Tico-tico no fubá

20 de dez. de 2007

Absurdo

Além do fato absurdo e revoltante com a adolescente de 15 anos que permaneceu presa com 20 homens em uma mesma cela, no Pará, ainda temos de tolerar o jogo de empurra das autoridades responsáveis. No frigir dos ovos, ninguém é responsável! É a novela de sempre no Brasil. A última agora é a da juíza da comarca de Abaetetuba que declarou que não há nada de ilegal no processo da menina.
O que esperar de uma instituição cujos representantes compactuam com tamanha infâmia e crueldade?

19 de dez. de 2007

Protesto contra O Globo

A professora Maria Helena Zamora, da PUC-Rio, escreveu ao jornal O Globo uma carta de protesto contra o editorial “Ensino e punição", de 18/12, e conclama outra pessoas a escreverem protestando contra a posição do jornal de instigar a aprovação da redução da maioridade penal.
Leiam a carta da professora ao jornal:

"Srs.:
Foi com surpresa que li o editorial deste jornal assumindo posição favorável à redução da maioridade penal. Esta medida extrema não reduzirá a violência, já que as estatísiticas mostram que apenas 10% dos crimes de todo tipo são cometidos por adolescentes. Deste potencial ofensivo reduzido, entre 8% são crimes contra a vida e neste percentual, os crimes ditos hediondos são uma exceção. Isso perfaz cerca de 1,09% do total de infrações violentas registradas no país. Infelizmente, o quadro de violência pode piorar - e muito - com a inserção imediata de cerca de quinze mil jovens nas já superlotadas e precárias prisões. O único efeito seria o de repetir em grande escala a barbaridade que fizeram com a menina no Pará. Com o espírito de vingança não se contrói a paz, mas com educação, assistência, geração de emprego e renda, igualdade.
Em sua maioria os infratores são jovens negros, muito pobres e já marcados por violências - o que mostra que ela não ajuda a mudar ninguém. O adolescente já é devidamente - e mesmo rigorosamente - responsabilizado por seus atos com a legislação vigente. As medidas repressivas têm em comum sua ineficácia e a facilidade com que se pisa nos miseráveis."
_______________________
Maria Helena Zamora é organizadora do livro "Para Além das Grades: Elementos para a Transformação do Sistema", da editora LOYOLA, publicado em 2005.

Produzindo a não humanidade da pobreza. Historicizando os estabelecimentos para a internação dos chamados delinqüentes, avaliando e debatendo o Estatuto da Criança e do Adolescente, trazendo experiências com funcionários do Departamento Geral de Ações Socioeducativas do Estado do Rio de Janeiro (Degase), colocando em análise a doutrina de proteção integral e retratando o Cotidiano de adolescentes institucionalizados, este livro nos revela uma terrível realidade: o tratamento dispensado aos adolescentes pobres em nosso país. Terrível e perversa realidade que vem sendo alimentada pela indissolúvel relação que se constituiu ao longo dos séculos entre pobreza e criminalidade. Relação que vem produzindo não somente não cidadãos, mas fundamentalmente seres menos humanos que outros.
Cecília Coimbra- Universidade Federal Fluminense
Grupo Tortura Nunca Mais

17 de dez. de 2007

Justiça de brincadeira

Justiça no Brasil parece "de brincadeira". Isto é um acinte. E nós sustentamos o espetáculo, somos os bobos da corte. Leiam a notícia de hoje:
TJ anula julgamento de acusado de matar Dorothy Stang
Por maioria de votos, o Tribunal de Justiça do Pará anulou hoje o segundo julgamento de Rayfran das Neves Sales, acusado de matar a missionária Dorothy Stang, em fevereiro de 2005, em Anapu (PA). Ele foi condenado em outubro, por unanimidade, a 27 anos de prisão pela morte da missionária.
De acordo com a assessoria, o TJ acolheu o recurso apresentada pela defesa de Rayfran, que alegou cerceamento do direito de defesa do acusado. Por conta disso, Rayfran será submetido a um novo julgamento --que ainda não tem data para ocorrer.
No julgamento de outubro, o segundo, Rayfran disse ter matado a freira a tiros, mas negou que tivesse sido contratado por fazendeiros para assassiná-la.
Segundo Rayfran, ele matou a missionária pois foi ameaçado por ela quando ia plantar capim no lote 55, em Anapu. A área era reivindicada pela freira para a criação de um projeto de assentamento rural.
Para o Ministério Público Estadual, a morte de Stang foi encomendada por R$ 50 mil. A defesa de Rayfran alegou que ele cometeu o crime pois estava sendo ameaçado.
O julgamento de outubro foi o segundo de Rayfran. Ele já havia sido julgado pela morte de Stang em dezembro de 2005 e condenado a 27 anos de reclusão. Como a pena excedeu 20 anos, ele teve direito a um segundo julgamento.
(Fonte Folha Online - 17/12/2007)

"Enrubescer nazistas"

Ministro Marco Aurélio diz que
"prisões brasileiras fariam
enrubescer nazistas"
Num discurso em que atacou a omissão do Estado, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello disse que, em alguns casos, os métodos de repressão utilizados no Brasil fariam "enrubescer nazistas". Para ele, essa omissão ajudou a gerar situações como a prisão de uma menor com 20 homens no Pará e os detentos acorrentados do lado de fora de uma delegacia de Santa Catarina. O ministro foi contundente contra a violação de direitos humanos, dizendo que o Estado brasileiro desonra a Constituição quando "amontoa presos em cadeias imundas, sem luz, sem banheiros, sem ar, sem um mínimo de dignidade".
O próprio Estado aparece cada vez mais como partícipe, por ação ou omissão, por desconhecimento ou despreparo, por negligência, comodidade ou conformismo - afirmou o ministro, durante a entrega do Prêmio Franz de Castro Holzwarth de Direitos Humanos, na sede paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), em solenidade realizada no Dia Internacional dos Direitos Humanos.
"Mentalidade reinante é de castigar e não de recuperar"
Na opinião de ministro, as prisões brasileiras não cumprem o papel de ressocialização dos detentos: "Parece claro que a mentalidade reinante é a de puramente castigar e não a de recuperar. Os métodos, em certos casos, fariam enrubescer nazistas. Na época de exceção, os torturadores legitimavam as mais terríveis selvagerias com panacéias ideológicas. E hoje, o que justifica tanto desprezo pelos mais básicos direitos humanos, pela humanidade de quem delinqüiu?"
E completou:
"Ainda no calor das comemorações (a subida do Brasil no IDH), o GLOBO divulgou fato dos mais humilhantes para governos com pretensões progressistas: 52% dos menores presos ou são mortos nos cárceres disfarçados de centros de ressocialização ou, soltos, retornam à prática delituosa."
( O Globo - 11/12/2007)
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Minha opinião
Muito bom um ministro do STF declarar com todas as letras a barbárie do nosso sistema carcerário. Só que... fica uma indagação: ele não é um dos responsáveis? Ele não é uma das mais altas autoridades do sistema judiciário? Como é de praxe neste país, ninguém é responsável por nada. Todos lavam as mãos. Certa vez procurei um juiz da Execução Penal para que ele interferisse na situação da cadeia da minha cidade onde os presos vivem enjaulados como bichos, sem a mínimo de assistência do estado que a lei prevê. O juiz, sem esboçar a mínima atenção, me despachou com um definitivo "não é da minha alçada". Como disse o grande revolucionário Jesus Cristo, diante da hipocrisia e crueldade das classes abastadas do seu tempo:
"Serpentes! Cambadas de víboras!"

15 de dez. de 2007

Niemeyer completa 100 anos

Trechos da entrevista ao jornal Estado de Minas hoje:
"Não penso que sou importante. Acho ridículo o sujeito que imagina ser importante. Importante é o contato, é a solidariedade. Algo tão simples, porém difícil de encontrar hoje em dia. "

"Os jovens não podem continuar sem ler, sem se informar, entrando para escola, para o superior e saindo como especialistas. Cada um só pensando em sua profissão. Durante o curso superior tem que entrar em contato com a vida, com os problemas do mundo. De modo que, quando saírem para a luta política, estejam preparados a colaborar e participar. "

"Sou um ser humano como outro qualquer. Gosto de ficar sozinho e a solidão não me perturba, pelo contrário, é quando fico pensando na vida, no que posso melhorar. Isso me dá conforto e me faz achar que estou no caminho certo, sem entusiasmo, porque a vida não é tão boa assim."

"A morte é inevitável. A vida é o princípio da morte. A gente tem que estar preparado e sentir o pouco que representamos nesse universo fantástico. A importância é o sujeito se informar, não ficar pensando nele mesmo, achar que o mundo existe, procurar compreender, ser útil e ter prazer em ajudar os outros."

Inferno carcerário

Deu no blog do Emir Sader

O inferno carcerário e as penas alternativas
O episódio da menina na cela de presos homens e a revelação de que não se trata de um caso isolado é apenas um episódio a mais no inferno carcerário brasileiro. Sabemos que nosso sistema penitenciário não é feito para recuperar – como deveria ser -, mas para isolar, punir e, se possível, exterminar – se não fisicamente, pelo menos a humanidade dos que ali são recluídos.Sabemos que quem chega até ali, por uma ou outra razão, nao sai mais, salvo que fuja. As tramas cruéis da instituição fechada se encarregam de devorar seus membros. As cenas que os que estamos aqui fora conhecemos dali são apenas a confirmação de que nada queremos, nem esperamos daquele mundo. Queremos que fiquem ali para sempre, recluídos, fechados, isolados. São, para nós, bárbaros.
Reforçados por esse clima repressivo, pede-se cada vez mais penas, cada vez mais reclusões. Uma sociedade que demanda isso, tem que estar disposta a pagar mais impostos para construir prisões, delegacias, para ter mais policiais, mais juízes, mais camburões, mais repressão, mais caveirão.
Reproduz-se assim o inferno que estamos vivendo, dentro e fora das prisões. Enquanto isso, medidas tão simples como as que prevêem penas alternativas, praticamente não são utilizadas. Trata-se de processos de socialização dos condenados como réus primários a infrações simples, que em lugar de conviver de maneira promíscua nas prisões, com os riscos de contaminação de todo tipo, tem a possibilidade de recuperar-se prestando serviços à comunidade.As experiências existentes são muito positivas e alentadoras.
Quando trabalhei na prefeitura de Luiza Erundina, em São Paulo, as penas alternativas foram utilizadas amplamente, com condenados prestando serviços de marcenaria, de pintura e de outras atividades similares em escolas públicas. Os resultados não poderiam ser melhores. Combina-se a tradução da pena em serviços que retribuam à comunidade pelos danos causados e tem uma dimensão de ressocialização.
Ao invés disso, essa ânsia de penalização que é multiplicada conscientemente pela imprensa – incluindo a rejeição da lei que limitava a compra de armamentos, as iniciativas para diminuir a idade de imputabilidade penal, para instituir a pena de morte, para aumentar as penas -, quer avançar na direção oposta, com a criminalização da pobreza, das lutas sociais, da infância e da juventude pobre, que perambula pelas ruas, praças e esquinas de sociedades que os discriminam, os rejeitam, os criminalizam.
Diminuir a população carcerária com a prática sistemática de penas alternativas contribui, ao contrário, para diminuir a superlotação das prisões, a contaminação de condenados primários com outros, para a ressocialização e recuperação dos que cometeram delitos primários. Não resolve todos os outros problemas, mas ajuda a retomar a função de reeducação das penas, a diminuir o caráter multiplicador da criminalidade dentro das prisões, sua promiscuidade física e social.
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Entre os vários comentários sobre o texto do Emir, transcrevo a esclarecedora opinião do leitor Adriano Moreira, que retrata a realidade do nosso sistema penal. Pena que tão poucos tenham este conhecimento e sejam desprovidos do preconceito contra a população carcerária.

Adriano Moreira diz:
11/12/2007
Creio que a carceragem, o sistema prisional, seja o maior símbolo da exclusão e de toda a desumanidade de nossa sociedade.
Aos pobres foram negados direitos fundamentais de cidadania e o "mau" comportamento era de se esperar. Um atributo natural da vida é a regeneração. Pode-se dizer que todos têm (ou deveriam) o direito à regeneração. Admiro profundamente pessoas que são exemplos de virtude. Procuro imitá-las. Mas sabemos que são muito poucos aqueles que estão completamente isentos de atos que são, de alguma forma, condenáveis. Mesmo que seja um crime previsto em lei, na maioria dos casos haveria a chance de regeneração por parte do criminoso e, claro, também o perdão por parte da eventual vítima. Refiro-me a casos mais frugais, que não sejam atentados contra a vida, por exemplo.
Mas, como escreveu Renato Russo, "a primeira vez é sempre a última chance".
O nosso sistema prisional é quase como se fosse uma prisão perpétua. E nós, que estamos do lado de fora e possivelmente nunca estivemos do lado de dentro, não sabemos o que é ter privação de liberdade. Não entendemos que isso também é um tipo de tortura. Agora, imaginem uma criança de 12 anos, que é encarcerada por, digamos como exemplo, ter cometido um furto ou por fazer entrega de substâncias ilícitas? Vai conhecer o inferno aos 12 anos. Vai ser submetido à privação de liberdade, será marcado para sempre pela violência sem nem ter tido a chance de compreender como é esse mundo em que vivemos.Eu acho o sistema prisional um grande absurdo, uma grande humanidade.
E fico horrorizado quando vejo as pessoas reclamando da impunidade ou bradando por mais repressão. Acho que essas pessoas são insensíveis e cruéis. Será que não sabem que a pena a que são submetidos esses juvens, geralmente, é completamente desproporcional ao crime cometido e de que essa pena se dá, em grande parte, à margem da lei, que são a superlotação, a falta de seleção, os espancamentos e torturas, etc. É nossa elite branca e cruel.

14 de dez. de 2007

Morte do advogado Geraldo Gomes de Paula

Ideologia da repressão
João Baptista Herkenhoff

O trágico episódio deve ser motivo para uma discussão ampla sobre o papel da Polícia numa sociedade democrática

O país redemocratizou-se há vinte anos atrás. Uma Constituição foi votada com intensa participação popular, como nunca havia acontecido no transcurso de nossa História. A Assembléia Constituinte que votou a Constituição de 1988 abriu-se à escuta dos anseios da cidadania. Dessa escuta resultaram emendas populares assinadas por cerca de quinze milhões de eleitores. As vozes da rua pleitearam Justiça Social, Educação, Democracia, Direitos Humanos. Não houve emendas populares pedindo o retrocesso institucional, o endurecimento da repressão, a supressão de garantias. Chegava-se ao fim do túnel e a comunidade nacional queria respirar Liberdade.
Entretanto, em contraste com a esperança de um novo ciclo histórico, bolsões de pensamento e comportamento ditatorial permaneceram em muitas instituições e espaços sociais, inclusive na Justiça, na Polícia, em órgãos de Governo, na Universidade, nos meios de comunicação.
É esse substrato cultural autoritário que está atrás de atos de violência praticados por autoridades públicas contra o cidadão. É esse substrato cultural que faz com que a Polícia, e até mesmo a Justiça, presuma a culpa e determine que a inocência seja provada. É esse substrato que admite que, na persecução do crime, vidas de inocentes possam ser sacrificadas.
Faço estas reflexões a propósito da morte do advogado Geraldo Gomes de Paula, nas dependências de uma Delegacia de Polícia de Vitória. Esse digníssimo advogado foi vítima da brutalidade quando se encontrava no estrito cumprimento do dever. Seu falecimento é chorado, não apenas por sua família, mas também por milhares de pessoas que testemunharam sua retidão moral e dignidade de espírito.
À luz da ideologia da repressão não se entende o papel do advogado criminal, que é visto como “inimigo público”. Não se compreende que o advogado é indispensável à Justiça e que sem respeito ao advogado a Democracia naufraga. O advogado não defende o crime, mas sim o acusado de um crime ou até mesmo o culpado. Julgamento criminal que se faça sem a presença independente e atuante do advogado não é julgamento, mas arremedo de julgamento, farsa.
A violência urbana que, com razão, amedronta o povo, encoraja a ideologia da repressão. Segundo essa ideologia, tropas especializadas, com atiradores de elite, estão autorizadas a matar, uma vez que se encontram no desempenho de papel estratégico para preservar a segurança pública. O resultado disso é uma ilusória segurança, como estamos vendo todo dia.
Sem prejuízo da honesta, transparente e integral apuração dos fatos que causaram a morte do advogado Geraldo Gomes de Paula, o trágico episódio deve ser motivo para uma discussão ampla sobre o papel da Polícia numa sociedade democrática, debate esse que deve ser travado na sociedade e dentro da corporação policial.

João Baptista Herkenhoff
é Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo – professor do Mestrado em Direito, magistrado aposentado e escritor.
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NOTA
Sobre o artigo, leia a postagem Advogado morto no ES , neste blog

10 de dez. de 2007

60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948 - 2008)

A Declaração Universal de Direitos Humanos foi aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.

*Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos.

*Ninguém será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.

* Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado.
* Todo o homem tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.
*Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras.

Declaração completa
Leia

Corregedora defende policiais

Destaco a opinião de dois leitores da Folha Online, 8/12, sobre a entrevista com a Corregedora de polícia do Pará que ainda defendeu os policiais que prenderam adolescente em cela com presos, dizendo que eles foram levados ao erro pela própria menina e que esta foi estuprada porque se insinuava para os presos. Se isso parte de uma corregedora, que mais podemos esperar?

Menor na cadeia
"As declarações da corregedora geral da polícia do Pará sobre a prisão e estupro da garota L., buscando inocentar os responsáveis pela prisão e culpar a vítima, apenas confirmam aquilo que a ONU acaba de apurar sobre a violência nas prisões do Brasil, cujo relatório o governo quer impedir que seja publicado.
A prisão ilegal de uma mulher no meio de outros presos, deixados à vontade para violentá-la, com amplo conhecimento das autoridades policial, judiciária e do Ministério Público, é irregularidade gravíssima, seja ela maior de idade ou não e configura, além do abuso de poder, improbidade administrativa nos termos da lei 8.429/92. Se houvesse seriedade na administração pública desse país, todos --delegado, juiz e promotores-- deveriam estar enquadrados na lei de improbidade administrativa (lei 8.429/92) e afastados de suas funções! Afinal, houve clara afronta aos princípios da legalidade e da moralidade administrativa. Portanto, mais que cumplicidade e frases evasivas, vamos esperar que os órgãos superiores da Justiça cumpram o seu papel."
JOEL GERALDO COIMBRA (Maringá, PR)
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"A contar pelas declarações proferidas pela delegada corregedora do Estado do Pará ( Cotidiano, 6/12), parece que estamos diante da seguinte situação: o Estado do Pará contra a adolescente L., 15 anos. A jovem é tratada pelas autoridades como responsável pelo seu próprio sofrimento e a cada pronunciamento oficial fica mais clara a vergonhosa falta de discernimento moral que norteia a conduta das autoridades estatais."
MARTA DOS SANTOS TERRA (São Paulo, SP)
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Abaixo a matéria com as declarações absurdas da corregedora geral da polícia do Pará

"Policiais foram levados ao erro", diz delegada
Corregedora do Pará diz acreditar nos policiais que culpam a menina por mentir a idade ao ser presa; "são pessoas que têm formação" . À frente da apuração do caso da garota L., delegada afirma que, segundo depoimentos dos presos, a jovem se insinuava para eles
Responsável por investigar a atuação dos policiais que colocaram uma menina de 15 anos em uma cela com homens em Abaetetuba (PA), a delegada corregedora Liane Martins minimizou a culpa dos policiais no caso e jogou a responsabilidade para a própria garota."A todos os delegados ela se apresentava como maior de idade. Não acredito que eles estejam mentindo. São pessoas que têm formação", disse em entrevista à Folha.A corregedora afirmou que os delegados foram "levados ao erro" pela adolescente -que foi abusada sexualmente durante os 26 dias em que permaneceu na cela da delegacia da cidade do Pará. Por isso, diz ela, não há motivos suficientes para a demissão dos policiais. "Eles têm responsabilidade, alguma negligência houve, mas não é o caso de demissão. Até o momento, não."Disse que por várias vezes a menina provocava sexualmente os presos e insinuou, assim como o ex-delegado-geral da Polícia Civil do Pará, Raimundo Benassuly, que a garota tem algum problema psíquico."Ela podia ser submetida a uma avaliação por assistentes sociais, psicólogos, para saber porque fazia isso [falar aos policiais que tinha 19 anos]. Mas não posso dizer [que a garota tem problema]. O delegado-geral caiu por causa disso", afirmou a corregedora.Há uma semana, Benassuly chamou a jovem de débil mental, durante audiência pública para discutir o caso no Senado. No dia seguinte, com a repercussão da declaração, teve de pedir demissão.Sistema penalDurante toda a entrevista, a corregedora defendeu os policiais. Diz que cabia ao sistema penal (Justiça e superintendência do sistema prisional) ter transferido a garota e que a jovem nunca relatou aos agentes prisionais as agressões sofridas. "Os policiais que eu já ouvi reforçam que ela estava sob a custódia do sistema penal. Os carcereiros também dizem que ela nunca relatou os fatos a eles."Segundo Liane Martins, a garota disse que não recebeu visitas de familiares "porque os presos não permitiam que ela se aproximasse das grades". A delegada responsável pelo flagrante disse que notificou a família, que nega.A corregedora já ouviu os depoimentos da garota, dos pais biológicos, dos cinco conselheiros tutelares, de quatro delegados, de dois escrivães, de agentes prisionais e investigadores e de 17 presos. A investigação da conduta dos envolvidos teve início no dia 22. São 30 dias até a conclusão da sindicância.Para ela, até agora, a única dúvida no caso é saber o motivo de a menina ter mentido a idade. "A todos os delegados, ela se apresentava como maior. Só posso tirar a dúvida se a reinquirir, o que acho pouco provável, porque ela está no programa [de proteção federal]."A entrevista foi concedida na corregedoria, em Belém. Ela contou à reportagem que outras quatro mulheres já haviam ficado na mesma cela, também com homens. E que os juízes de Abaetetuba sabiam disso, porque a superintendência da Polícia Civil enviou ofícios pedindo as transferências e não obteve resposta.De acordo com o depoimento dos presos, disse a corregedora, apenas um abusou sexualmente da menina. "Os demais [atos sexuais] foram por livre e espontânea vontade da própria adolescente. Ela se deitava na rede dos presos novatos e mantinha relações com eles. Os 17 presos que estiveram na delegacia dizem a mesma coisa."A corregedora afirmou ainda que nenhum dos presos ajudou a garota porque "no cárcere é cada um por si e ninguém se mete na vida de ninguém". "Um dos presos confirma que ela gritou e pediu ajuda, mas que não podia se meter, pois ali dentro existe a lei do silêncio", disse Liane Martins.Ela não soube responder ao fato de os cabelos da menina terem sido cortados a facão por policiais. A garota disse que poderia até reconhecê-los. "Os policiais não confirmam isso."Mexia com os presosSegundo a delegada, a garota chegou a fazer sexo com um dos presos por comida. Disse, no entanto, que, segundo os depoimentos dos detentos, ela se insinuava para eles. "Quando ela saía para tomar banho, mexia com os presos, saía andando se exibindo nua. Os presos ficavam irritados com ela e a mandavam vestir uma roupa. Ela não criava jeito."Em viagem, a governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT), não foi localizada pela reportagem para comentar as declarações da corregedora.
(Folha de São Paulo - Cotidiano - 5/12/07)

9 de dez. de 2007

Intelectuales apolíticos

Un día, los intelectuales apolíticos de mi país serán interrogados por el hombre sencillo de nuestro pueblo. Se les preguntará sobre lo que hicieron cuando la patria se apagaba lentamente, como una hoguera dulce, pequeña y sola.
No serán interrogados sobre sus trajes, ni sobre sus largas siestas después de la merienda, tampoco sobre sus estériles combates con la nada, ni sobre su ontológica manera de llegar a las monedas.
No se les interrogará sobre la mitología griega, ni sobre el asco que sintieron de sí, cuando alguien, en su fondo, se disponía a morir cobardemente.
Nada se les preguntará sobre sus justificaciones absurdas, crecidas a la sombra de una mentira rotunda.
Ese día vendrán los hombres sencillos. Los que nunca cupieron en los libros y versos de los intelectuales apolíticos, pero que llegaban todos los días a dejarles la leche y el pan, los huevos y las tortillas, los que les cosían la ropa, los que le manejaban los carros, les cuidaban sus perros y jardines, y trabajaban para ellos, y preguntarán, "¿Qué hicisteis cuando los pobres sufrían, y se quemaba en ellos, gravemente, la ternura y la vida?"
Intelectuales apolíticos de mi dulce país, no podréis responder nada. Os devorará un buitre de silencio las entrañas. Os roerá el alma vuestra propia miseria. Y callaréis, avergonzados de vosotros.
Otto René Castillo - (1936-1967)
Poeta guerrilheiro capturado em La Sierra de las Minas, com sua mulher Nora Paiz. Foram queimados vivos em 17 de março de 1967, durante o governo de Méndez Montenegro. Viveu 31 anos, deu a seu povo seu canto e sua vida. Que mais pode dar um poeta?
Fonte: Blog Vivo e desnudo

8 de dez. de 2007

Palácios do Judiciário

Judiciário não tem controle de seus gastos

Leiam de hoje na Folha de São Paulo (Caderno Brasil)

Tribunais custam de R$ 22 mi a R$ 498 mi
Obras previstas do Judiciário evidenciam grande disparidade de valores; não há nenhum tipo de padrão para os edifícios. A nova sede do TRF da 1ª Região, em Brasília, é a mais cara construção entre as programadas para os próximos quatro anos

Após as batalhas para proibir o nepotismo no Poder Judiciário e limitar o salário dos juízes ao teto do funcionalismo, de R$ 24.500, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) faz vista grossa a outra má tradição dos tribunais brasileiros: a construção de palácios.
Há grande disparidade de valores nas obras previstas na proposta de Plano Plurianual de 2008 a 2011. Os custos variam de R$ 22,6 milhões a R$ 498 milhões. Em nome da autonomia administrativa e financeira, cada tribunal arbitra livremente dimensões e padrão de suas novas instalações.
Um grupo de deputados da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara sugeriu recentemente à presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) e do CNJ, ministra Ellen Gracie, que o conselho passe a controlar esse gasto.Procurada pela Folha, a ministra informou, pela sua assessoria, que não encaminhou a sugestão ao CNJ porque os deputados não formalizaram nenhum pedido, apenas fizeram "comentários" durante audiência. Ela disse que preferia não falar sobre assunto relativo à autonomia dos tribunais.
Entretanto, um ministro do STF e dois conselheiros do CNJ ouvidos pela Folha disseram, em caráter reservado, que o conselho poderia ao menos fazer recomendações aos tribunais, criando padrões, como fixar limites de dimensões do gabinete do juiz.
A obra mais cara, dentre as programadas para os próximos quatro anos, é a nova sede do TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, com sede em Brasília, que está orçada em R$ 498 milhões, dos quais R$ 103 milhões serão liberados até 2011. São 168,9 mil metros quadrados, com o custo do m2 estimado em R$ 2.877, incluindo 60 mil m2 destinados a garagens em subsolos.
Outra obra polêmica é o novo prédio do CJF (Conselho da Justiça Federal), em Brasília. Há dois anos, o então presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Edson Vidigal decidiu ceder a sede existente para juizado especial federal e transferiu o órgão para as instalações do tribunal. Neste momento, o órgão planeja construir uma sede, ao custo de R$ 60 milhões. A obra foi aprovada pelos atuais membros do CJF. O atual presidente do STJ e do CJF, Raphael de Barros Monteiro Filho, disse que a obra é necessária.
Ainda em Brasília, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) se prepara para construir a nova sede, de 116 mil metros quadrados, ao custo de R$ 329 milhões, o que corresponde a R$ 2.835 o metro quadrado.
O TRF da 3ª Região, em São Paulo, irá reformar o seu edifício-sede ao custo de R$ 36,7 milhões, valor superior ao que os TRFs da 4ª Região, em Porto Alegre, e da 5ª Região, em Recife, prevêem para cada um construir um prédio anexo, de respectivamente R$ 22,6 milhões e R$ 30 milhões.O TRT (Tribunal Regional do Trabalho) da Bahia tem R$ 122,058 milhões previstos no PPA para executar uma obra de 60 mil metros quadrados, mas poderá ampliar o projeto.
Apesar de ter previsto gasto de R$ 115 milhões para construir a sua nova sede, sendo R$ 23,8 milhões para os próximos quatro anos, o TRT do Rio de Janeiro ainda não tem projeto pronto nem sequer definição de área a ser construída.A disparidade de valores pode ser atribuída à diferença de dimensões dos tribunais, que têm volume de processos e número de servidores distintos. O problema é que não há nenhum tipo de controle.
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Comentário do blog
Pois é... se ainda tivéssemos "justiça", dava para engulir tanto luxo e desperdício. Até quando o Judiciário vai abusar da nossa paciência?

7 de dez. de 2007

Pausa para sanidade mental

Nós, que sentimos na carne as dores da injustiça neste país, precisamos de uma pausa para manter a sanidade mental. E para isso, nada melhor do que música e dança. Trouxe hoje o vídeo do melhor momento do filme "Curtindo a vida adoidado". Lindíssimo quando Matthew Broderick interrompe aquele desfile convencional com sua alegria e leva todo mundo a dançar! Lembra-nos o quanto poderíamos ter uma sociedade mais feliz, como menos violência, se houvesse mais dança e música em nossa forma de viver. Lembro Rabindranath Tagore quando diz: "Deus me respeita quando eu trabalho, mas me ama quando eu canto".

6 de dez. de 2007

Justiça, que vergonha!

Transcrevo da revista Época, 23/11/2007 - Edição nº 497


A Justiça sem vergonha na cara
Ruth de Aquino
Redatora-chefe de ÉPOCA
O jornalista Pimenta Neves, condenado por homicídio, crime hediondo, comemora 7 anos de liberdade

No Brasil, a justiça tem muitas caras. E pouca vergonha. Na semana passada, o jornalista Pimenta Neves comemorou sete anos de liberdade. Em agosto de 2000, ele matou a ex-namorada e também jornalista Sandra Gomide com dois tiros: um pelas costas e o segundo, no ouvido esquerdo, quando Sandra estava caída no chão.
A decisão de mantê-lo livre foi do Superior Tribunal de Justiça, na terça-feira.
Na quinta-feira, o flanelinha Marcelo de Mello Valério teve menos sorte. Foi condenado a 30 anos de prisão, pelo assassinato de Ana Cristina Johanpetter, em novembro do ano passado. Ex-mulher do vice-presidente do Grupo Gerdau (sexto maior do Brasil, com faturamento anual de US$ 13 bilhões), Ana Cristina foi baleada na cabeça num sinal de trânsito no Leblon, Rio de Janeiro, por demorar a tirar o relógio desejado pelo flanelinha. Bastou um ano para a Justiça agir com rigor.
Antônio Marcos Pimenta Neves tem 70 anos, vive numa casa em São Paulo, vai à praia em Ubatuba, e não gosta muito de jornalistas, embora seja essa sua profissão. Era diretor do jornal O Estado de S. Paulo quando cometeu o crime. Pimenta queria continuar a namorar Sandra, morena de 32 anos. Ele a demitiu do jornal após o fim do namoro, mas continuou a persegui-la. Sandra não queria reatar. Foi assassinada.
“Sob forte emoção” – como dizem seus advogados –, Pimenta saiu de casa armado para encontrar Sandra num haras em Ibiúna, a 64 quilômetros de São Paulo. Cavalgou por duas horas. E a matou.

Fugiu, mas, dias depois, confessou o crime, já orientado por advogados. Após manobras, recursos, liminares e habeas corpus, Pimenta enfrentou enfim um júri popular em maio do ano passado. Foi condenado, por crime hediondo, a 19 anos, 2 meses e 12 dias de prisão. Continuou recorrendo em liberdade. Em dezembro de 2006, três desembargadores do Tribunal de Justiça em São Paulo determinaram a prisão do réu e reduziram a sentença para 18 anos. Ele virou foragido. Sua advogada, Ilana Muller, pediu novo habeas corpus em Brasília. A ministra Maria Thereza de Assis Moura, do STJ, suspendeu o mandado de prisão. E o jornalista reapareceu.
Agora, o STJ confirmou a liminar da ministra Maria Thereza. Enquanto todos os recursos não forem julgados, Pimenta continuará livre. Por “presunção de inocência”. Essa expressão jurídica soa como escárnio. A liberdade de Pimenta é inconcebível do ponto de vista moral. “Para mim, a Justiça não presta neste país. A Justiça só é boa para quem tem dinheiro”, diz João Gomide, pai de Sandra, que sofreu três infartos.
Pimenta diz que “a tragédia deixou duas vítimas: a Sandra, principalmente, e eu”. O pai de Sandra não sente pena: “Peço aos médicos que não me deixem morrer antes de ver o assassino preso”.
Só flanelinhas homicidas são presos com rapidez no Brasil. Por que é permitido, por que é aceitável neste país demorar tanto para julgar recursos que tenham a ver com homicídio? A vida não deveria ser prioridade para a Justiça?
Como a juíza Maria Thereza consegue dormir o sono dos justos?
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Comentário do blog
Terminando este artigo, leiam abaixo como a justiça é "eficaz" com os pés-de-chinelo. Um dos acorrentados na foto é "suspeito de tentativa de furto de mercadoria em um supermercado". Para esses, não há "presunção de inocência", manobras, recursos, liminares e habeas corpus. Só para os da classe (leia-se laia) do jornalista Pimenta Neves. É assim: muda-se a interpretação da lei conforme o consumidor. A justiça muda até os 10 mandamentos bíblicos, introduzindo o "Matarás, mas não roubarás o supermercado".

5 de dez. de 2007

Barbárie em SC

Presos acorrentados em Palhoça (SC)
Autoridades desumanas e cruéis
Judiciário omisso, irresponsável e incompetente

Segundo a delegada Andréa Pacheco, responsável pela unidade de Palhoça, os pilares são usados há 2 anos e já estão "até gastos, pois é uma prática que vem de dois anos". Ela diz não entender "por que a situação só repercutiu agora".

A ministra Ellen Gracie faz o mea culpa sobre os horrores que têm acontecido nos sistema carcerário: "Há, realmente, uma falha no Judiciário, que sempre vai ocorrer quando houver ofensa aos direitos humanos. O Judiciário é a última trincheira do cidadão. Quando falham todos os outros serviços, que deveriam ter atuado, todas as instâncias policiais e administrativas, é ao Judiciário que o cidadão pode recorrer". (jornal O Globo, seção O País, 4/12)

E a ministra completa: "Vamos verificar se houve omissão do Poder Judiciário..."

Verificar, Ministra??? O elefante está a sua frente, e a senhora diz que ainda "vão verificar"? Sabe, ministra, quando essas pessoas, pobres e vítimas da discriminação e do abandono, são acorrentadas ou jogadas em nossas masmorras medievais que, certamente, a senhora não deve nem conhecer, ninguém verifica nada, são simplesmente pegas como se pega um animal e jogadas nesse inferno de Dante.
Ministra, há anos eu venho denunciando a infãmia do "seu" sistema carcerário. O jornal Recomeço já completou 136 edições em seu sétimo ano de existência. Sabe o que o seu Sistema Judiciário fez com as denúncias? Processou a denunciante. Eu sou a "criminosa". O crime de mostrar, através de um meio de comunicação, a máquina de extermínio de pobres e negros, a que a senhora e seus pares pertencem.
Eu vejo na televisão, os senhores todos, empombados em suas togas pretas, com suas falas empoladas, e, me desculpe, sinto-me enojada, por saber que nada disso tem a ver com o sofrimento e a injustiça em que vive o povo brasileiro. Gostaria que o sangue dos presos, que escorre das cadeias e presídios, vencesse a lei da gravidade e subisse e inundasse a torre de cristal em que os senhores vivem encastelados. Talvez só assim acordariam para o massacre promovido com vossa omissão.

30 de nov. de 2007

Deputado chama relator da ONU de "veadinho"

Fiquei chocada ao ler esta notícia no site Vi o mundo, do Luiz Carlos Azenha. De início, pensei que o Azenha estava brincando ou fazendo um texto humorístico de ficção, mas fui me dando conta que aquilo era real, que existe um deputado no Brasil que é capaz de tal ato bizarro (nome que Luiz Carlos dá à seção com notícias desse naipe). Segue a transcrição da notícia com minhas condolências ao estado do Rio por ter um deputado como esse em sua câmara. E a minha pergunta: como tal desrespeito e falta de decoro (no mínimo) é permitido a um deputado?

Deputado diz que funcionário da ONU que investiga execuções sumárias "deve ser uma bela bicha, daquelas bem arrependidas"

O deputado estadual Marcos Abraão, do PSL do Rio de Janeiro, subiu à tribuna no último dia 21 para atacar "esses idiotas da ONU, esse 'veadinho da ONU'", numa aparente referência a Philip Alston (foto à esquerda), o australiano que foi indicado pela Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas para investigar execuções sumárias, arbitrárias e extrajudiciais. Alston é professor de Direito da Universidade de Nova York e já dirigiu um projeto relativo a direitos humanos na União Européia. Ao visitar o Rio de Janeiro, Alston condenou alguns métodos utilizados pela polícia carioca para enfrentar o crime.
O deputado disse o seguinte:"Aproveito a oportunidade para falar de minha insatisfação ao ligar o rádio hoje e ouvir que mais três policiais foram assassinados - alguns Srs. Deputados, inclusive, já falaram aqui sobre Segurança Pública e do que vem ocorrendo neste Estado. Esses idiotas da ONU, esses antropólogos e “veadinhos” estão sempre falando nos jornais; alguns jornalistas idiotas, imbecis falam da Segurança Pública, mas são todos uns asnos. Nenhum deles entende qualquer coisa de Segurança Pública, muito menos esse “veadinho” da ONU – ele tem que ser tratado assim, por ter falado o que falou. Chamo de “veadinho” porque deve ser uma bela “bicha”, daquelas bem arrependidas! Não dá para entender por que esse tipo de pessoa quer atrapalhar um processo que caminha bem! Assomei à tribuna diversas vezes para parabenizar o Sr. Governador Sérgio Cabral por sua conduta diante da mídia quanto à Segurança Pública: “Vai haver um enfrentamento, e isso tem que acontecer, doa a quem doer”.Hoje, tivemos três policias mortos. E falar em enfrentamento, que a polícia tem que “ir para dentro” e fazer seu trabalho, é muito importante. Mas os Deputados que assomam à tribuna para falar da importância desse enfrentamento e que a polícia tem que fazer seu trabalho também têm que defender os policiais que estão sendo escrachados, que estão sendo covardemente prejudicados no estrito cumprimento do dever legal.Essa Corregedoria fajuta que temos – essa Corregedoria mentirosa, safada e cretina – a cada dia quer expulsar mais e mais policiais indevidamente! Esses Deputados que vêm aqui, junto comigo, falar têm que se preocupar também em dar um pouquinho de proteção a esses policiais que estão defendendo nossa família no dia-a-dia.É isso que nós temos que ver. Porque tem policiais sendo afastados do seu trabalho, expurgados da Polícia Militar indevidamente. E é isso que nós temos que ver. Não é só chegar aqui, elogiar, incentivar e dizer que tem que trabalhar. Não! Temos que nos preocupar. Temos que pegar esses “bichinhas”, esses “viadinhos”, dos direitos humanos e fazer com que eles trabalhem também pelos direitos humanos dos policiais. Porque tem um monte de “viadinhos” que só querem dizer que o policial fez e aconteceu, e que vão investigar. Ora, droga!"

Mais tarde, o deputado disse que não pretendia atacar os homossexuais, dizendo ter amigos gays que "são muito mais homens" que os tais "veadinhos" a que ele se referiu.
Segundo o repórter Ernani Alves escreveu no site Terra, em 10 de novembro, o australiano Philip Alston visitou o complexo de favelas do Alemão, no Rio de Janeiro:"Ele se reuniu com parentes de alguns dos 19 mortos na operação policial promovida em junho na região. Segundo Alston, alguns familiares admitiram que as vítimas tinham envolvimento com o tráfico de drogas. O relator, no entanto, disse que os depoimentos não justificam o fato de que agentes possivelmente executaram os suspeitos quando deveriam realizar prisões. O relatório da ONU que está sendo elaborado deve apresentar uma conclusão sobre o caso.
Representantes das Comissões de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ) e da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro foram os primeiros a levantar a suspeita de que os criminosos teriam sido mortos depois de já estarem imobilizados pela polícia e de que inocentes poderiam ter sido assassinados."
O deputado é acusado de matar um colega
O deputado Abraão não é alheio à controvérsia. Ele chegou a ser acusado de mandar matar um colega, o pastor da Igreja Universal Valdeci Paiva de Jesus, que foi executado em 24 de janeiro de 2003 com 19 tiros, perto da sede do PSL, na zona Norte do Rio. Abraão era suplente do assassinado e assumiu a vaga. A repórter Giselle Saporito escreveu no "Jornal do Brasil", em 24 de março de 2003: "O chefe de Polícia Civil, Álvaro Lins, afirmou há pouco, em depoimento na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), que o inquérito sobre a morte do deputado Valdeci Paiva de Jesus (PSL) já está concluído. Segundo o delegado, quatro pessoas foram indiciadas no caso: os presos Jorge Luiz Silva e Adilson da Silva como executores; o inspetor Roberto Basila, que teria facilitado a fuga dos presos e o assessor do deputado Marcos Abraão (PSL) Wanderlei da Cruz. ''Apesar de haver indícios sobre a acusação do deputado no crime, não há provas suficientes para qualificá-lo formalmente como mandante do crime'', disse Lins.

28 de nov. de 2007

Processo contra o Recomeço

Sou processada pelo juiz de Direito por denunciar regime de barbárie na cadeia pública de Leopoldina. Presos ficaram 11 meses sem sair da cela nem para um banho de sol

Neste momento em que as pessoas se perguntam como foi possível a barbárie de uma adolescente mantida presa com homens numa cela no Pará, é hora da sociedade tomar conhecimento de como funciona a falta de transparência do Judiciário e mesmo a truculência e abuso de poder de alguns de seus membros, inclusive juízes de Direito, que deveriam ser exemplo de responsabilidade, urbanidade, imparcialidade e até mesmo de humildade na importante missão de julgar seres humanos.
Ano passado, divulguei aos meus leitores, amigos, e na internet, que estava sendo processada pelo juiz de Direito Dr. José Alfredo Junger de Souza Vieira, então titular da 3ª vara Criminal de Leopoldina, por ter publicado no jornal Recomeço, edição 117, as condições desumanas da cadeia pública de Leopoldina. O trecho que o juiz alega ser "ofensivo" é o seguinte:

“Não é aceitável a conivência de magistrados, fiscais da lei, advogados, enfim, operadores do Direito, com tamanha barbárie. O regime atual é um desrespeito à Constituição, à lei, aos cidadãos deste país, enfim, à nossa inteligência”.

Como difamar alguém sem nem citar o seu nome? Como considerar difamação denunciar irregularidades em uma instituição pública? Isso é dever de qualquer cidadão em pleno estado de Direito.
Meu objetivo foi chamar atenção das autoridades para a situação da cadeia, na qual os presos estavam há vários meses, além da condição normal de presos em jaulas, sem trabalho, sem saúde, sem lazer, sem material de limpeza e higiene, ainda mais castigados: sem sair da cela nem para um banho de sol e sem visitas (alegava-se uma tentativa de rebelião para o castigo). Esse "castigo" já vigorava 11 meses na época. Nesse período, os presos escreveram vários textos, nas edições mensais do jornal implorando por, pelo menos, um banho de sol diário, que até os condenados pelo regime RDD têm direito.

Pela LEP - lei de Execução Penal - art. 45 -"São vedadas as sanções coletivas" e Art. 58 -"O isolamento, a suspensão e a restrição de direitos não poderão exceder a trinta dias", ressalvada a hipótese do regime disciplinar diferenciado." Portanto, quem descumpriu a lei foi o juiz da Execução Penal, que aplicou pena coletiva e excedeu os 30 dias para onze meses. E só suspendeu o castigo, perto de completar um ano, porque denunciamos no jornal.

Desde 2005, já perdi a conta de quantas vezes fui chamada na polícia e compareci a audiências. No dia 14 deste mês, compareci a mais uma audiência, acho que a terceira, e me "ofereceram" uma transação penal, na qual está implícito que "cometi um crime". Disse à juíza que não aceitava, pois isso significa concordar com uma excrescência: chamar de crime o cumprimento do meu dever de cidadã de denunciar o descumprimeto da lei e a barbárie a que os presos estavam sendo submetidos. Além disso, estou sendo vítima de danos morais e físicos, agredida em minha dignidade e minha saúde, ofendida, e ainda tendo gastos com advogado. A juíza, na terceira audiência, alegou que isso não é ofensa. Deduzo que o judiciário foi feito para pessoas que não sentem vergonha, que não se indignam, que não têm senso de justiça, diante do fato de uma juíza considerar que passar por tudo isso não é ofensa.

Esclareço ainda que, antes de publicar no jornal, fui ao Fórum solicitar ao juiz que corrigisse a situação ilegal em que os presos se encontravam, que além do regime desumano e cruel, da superlotação, do castigo ilegal, havia vários detentos sem acompanhamento jurídico, sem ao menos informação de como estava a situação deles atrás das grades. O juiz me respondeu que havia muitos processos em suas mãos e que "não tinha tempo" para os presos. Eu aleguei para ele que preso era prioridade, uma vez que tirar a liberdade de uma pessoa deve ser a mais alta preocupação e responsabilidade de um juiz.

O mais estranho e patético deste processo é que o juiz, que alegou não ter tempo para cuidar dos seus deveres, teve tempo para me processar.
E muito grave: nesta última audiência a juíza, diante da minha negativa de aceitar a transação penal, disse que "era melhor eu aceitar porque ela nem lera o processo, mas que eu não tinha nenhuma possibilidade de ser absolvida , ou seja, ela pré-julgou, atitude que jamais poderia ser aceita num juiz. Naturalmente que ela fez um pré-julgamento em função do corporativismo, já que o meu acusador é um colega de classe.

O nº do processo é 038405039696-7, no TJMG, comarca de Leopoldina. O editorial pode ser lido no site do jornal Recomeço http://www.jornalrecomeco.com/, clicando no "Edições Anteriores", nº 117.