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14 de fev. de 2008

Indignação e Solidariedade - Ir. Beth

Que inversão de valores!
É condenada aquela que deveria ser homenageada pela sua luta diária e intensa contra as crueldades do sistema burocratizado e desumano das nossas prisões.
Ela que, através do jornal Recomeço, há mais de seis anos, tem sido a voz rouca das celas superlotadas, da ausência total do estado e da comunidade , e da teimosia cidadã dos poucos que ousam dedicar uma vida inteira à causa, e de tempo integral, e não só de boca, mas de fato, contribuindo com várias ações que tentam melhorar o cumprimento da pena, de centenas (por que não milhares?), que passaram por todos esses anos de militância e dedicação.
Por diversas vezes, quando fui vereadora, fiz a indicação de prêmios merecidos para que sua luta fosse mais valorizada, mas você, Glória, sempre recusou, dizendo que fazia e faz por amor à causa, e não para alcançar medalhas e títulos.
Fiquei mais chocada ainda quando a malfadada sentença lhe imputa uma culpabilidade de que "poderia inclusive ter ocasionado a realização de outras rebeliões, podendo gerar, por que não, a morte de seres humanos".
Esta tem sido uma tônica na boca das autoridades todas as vezes que denunciamos em público a omissão destes. Recentemente fui proibida de entrar na cadeia por ter ido à rádio e dizer, entre outras coisas, que no Brasil a pena só é restritiva do direito de ir e vir, eles continuam com o direito à educação, à saúde, à alimentação, ao trabalho e, no entanto, estes direitos são descumpridos totalmente na maioria das cadeias e presídios.
Após a proibição da minha presença na cadeia, que dizem "incitava à violência", as tentativas de fugas continuam, as manifestações de desagravo com relação à comida servida continuam. Quer dizer que eu não sou o pivô e nem o Jornal Recomeço poderia ser condenado, e sim homenageado pelo brilhante serviço social.
Na edição de dezembro, na qual fizemos um concurso de Mensagens Natalinas com os detentos, ao entregar o jornal Recomeço em uma das celas da Cadeia de Cataguases, um dos detentos pegou na minha mão e disse: "D. Beth é a primeira vez que o meu nome sai em alguma coisa sem ser em página policial". E choramos juntos, ele pediu para orar por ele para Deus ajudá-lo a mudar o rumo de sua história.
Por esta e outras histórias e testemunhos verdadeiros é que vale a pena continuar. Glória, não desanime, você é uma guerreira.
Esta condenação, não tome só para você, ela é de todos nós, estamos sentindo a mesma dor da injustiça. O Profeta Amos (5.24) já clamava "Até que corra Justiça como um riacho perene", isso há 4.000 anos antes de Cristo. Sua luta não é vã.
(Beth, professora do projeto EJA na cadeia de Cataguases)

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