Rio de Janeiro, agosto de 2008
Marcello Salles
Dois exemplos de agosto mostram que a truculência ainda manda no Rio de Janeiro. A polícia do governador mata mais de mil pessoas num ano e não há liberdade para crítica nos meios de comunicação de massa. Agentes do estado torturam e não se pode levantar o debate sobre suas punições. Se é assim, então que sejam coerentes e reivindiquem claramente o Estado de Exceção!
Agosto ofereceu dois exemplos claros de como o autoritarismo ainda dá as cartas no Rio de Janeiro. No dia 5, terça-feira, foram destruídos dois outdoors com críticas à política de extermínio do governador Sérgio Cabral (PMDB), cuja polícia matou 1.330 pessoas em 2007, índice que a coloca como a polícia que mais mata do mundo. Dois dias depois, 7 de agosto, militares da ativa e da reserva, ao lado de civis, reuniram cerca de mil pessoas no Clube Militar para rechaçar o debate sobre a punição contra os torturadores da ditadura de 1964 – orientada pela CIA para garantir os interesses das corporações dos EUA no Brasil.
Dois exemplos de agosto mostram que a truculência ainda manda no Rio de Janeiro. A polícia do governador mata mais de mil pessoas num ano e não há liberdade para crítica nos meios de comunicação de massa. Agentes do estado torturam e não se pode levantar o debate sobre suas punições. Se é assim, então que sejam coerentes e reivindiquem claramente o Estado de Exceção!
Agosto ofereceu dois exemplos claros de como o autoritarismo ainda dá as cartas no Rio de Janeiro. No dia 5, terça-feira, foram destruídos dois outdoors com críticas à política de extermínio do governador Sérgio Cabral (PMDB), cuja polícia matou 1.330 pessoas em 2007, índice que a coloca como a polícia que mais mata do mundo. Dois dias depois, 7 de agosto, militares da ativa e da reserva, ao lado de civis, reuniram cerca de mil pessoas no Clube Militar para rechaçar o debate sobre a punição contra os torturadores da ditadura de 1964 – orientada pela CIA para garantir os interesses das corporações dos EUA no Brasil.
Os outdoors censurados continham um desenho assinado pelo artista gráfico Carlos Latuff, que retrata uma mãe negra, a segurar o filho morto no colo. Ela chora, desesperada. Seu filho é uma criança negra, vestida com uniforme da escola e, atrás dos dois, está um policial branco com um fuzil recém-disparado. Ao fundo, um caveirão, carro blindado da polícia, invade uma favela e dispara a esmo. A ilustração vinha acompanhada de duas frases: “Candelária, Vigário Geral, Baixada, Alemão, Acari, Providência...Estamos mais seguros?” e “Infeliz é a sociedade que assiste passivamente sua juventude ser assassinada”.
Essa imagem foi caprichosamente pintada com tinta branca até desaparecer. E não foi uma ação simples. Devido à altura do outdoor, foi preciso mobilizar pelo menos um veículo com carroceria e uma escada de grande porte. Como há uma câmera de vigilância da CET-Rio em frente ao cartaz atacado na Av. Presidente Vargas, basta a polícia querer para que os criminosos sejam identificados. Apesar de inegável, o fato jornalístico foi deliberadamente ignorado pelas corporações de mídia. Entre os veículos de papel, apenas uma colunista deu a noticia num jornalão. Na televisão, só o jornalismo da TV Brasil se interessou.
Uma das características do fascismo, como se sabe, é o emprego de modernos aparatos de propaganda e censura para suprimir a oposição política e promover seus próprios valores. Exatamente assim funcionou a ditadura civil-militar no Brasil, entre 1964 e 1985. Com o apoio entusiasmado da Rede Globo e os mesmos veículos de comunicação que hoje silenciam diante da censura aos outdoors, o Estado autoritário pôde encobrir seqüestros, torturas, homicídios e ocultações de cadáver.
Um clima revivido neste cinzento 7 de agosto, durante seminário promovido pelo Clube Militar. Em sua intervenção, o general da reserva Sérgio Augusto de Avelar Coutinho afirmou que os militares evitaram, em 1964, “um golpe populista de inspiração desconhecida, liderado pelo presidente de então e seu cunhado, governador do Rio Grande do Sul”. E concluiu como quem faz um alerta: “Há um processo socialista revolucionário em curso”. Os militares consideram o general Coutinho o maior especialista em Gramsci do Brasil e um grande conhecedor de Marx. Ele é assessor de uma empresa privada chamada Teixeira Nunes Comércio Exterior e Indústria e já foi agraciado com a medalha Legião de Honra, dos Estados Unidos.
Em seguida foi a vez de Antonio José Ribas Paiva, diretor da UDR, conferencista do Exército e pecuarista, criador de gado nelore. Foi o mais histérico dos três palestrantes. Sua fala exacerbou a paranóia do general Coutinho, tanto pelo conteúdo quanto pelos gestos agressivos. “Nos meus 59 anos nunca vi ditadura do crime como essa. Nós não temos segurança do direito. Portanto, o Brasil não é um país democrático”, disse. Sobre a iniciativa de punir os torturadores, comentou: “Estão trabalhando para que a sociedade volte a se dividir, contra a paz social. Dividir a sociedade para explorar seus recursos e manter a sociedade na pobreza”. Disse ainda, sem citar a fonte, que “esses senhores [do governo Lula] foram desvelados pela imprensa internacional por associação ao tráfico. Nós temos um governo que apóia as Farc, e 80% da cocaína tem procedência nas Farc. E não adianta o primeiro mandatário negar (aplausos) porque ele fundou o Foro de São Paulo, organizado por 48 movimentos terroristas”.
Em seguida, passou a descrever que São Paulo teve um dia de ataques terroristas do ETA e do IRA, porque “a esquerda radical se sentiu ameaçada por algum motivo”. Nesse momento, alguns ouvintes palpitavam “o impeachment do Lula, claro”, numa referência à tentativa frustrada da OAB-SP de depor o presidente da República. Por fim, quando os ânimos já estavam bem exaltados, falou o ministro do STF durante a ditadura, Waldemar Zveiter: “Que o senhor ministro da Justiça ou desapeie do cavalo ou monte direito, porque, se não, nós vamos tirá-lo de lá!”, uma clara ameaça ao ministro da Justiça Tarso Genro (PT), poucos dias depois que este proclamou o óbvio: quem torturou deve ser punido. E por temer pela correlação de forças, o presidente da República o desautorizou.
Os dois exemplos de agosto mostram que a truculência ainda manda no Rio de Janeiro. A polícia do governador mata mais de mil pessoas num ano e não há liberdade para crítica nos meios de comunicação de massa. Agentes do estado torturam e não se pode levantar o debate sobre suas punições. Se é assim, então que sejam coerentes e reivindiquem claramente o Estado de Exceção! E depois enfrentem as conseqüências.
Publicado no Agência Carta Maior
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